Por Márcio Santana Sobrinho
A presidente Dilma disse na segunda-feira passada, em
resposta às críticas feitas por Ronaldo “Fenômeno”, que “não temos complexo de
vira-latas”. Os inimigos do governo estão dizendo que esse discurso foi
cachorrada, mas ela falou sério — e dou razão.
Esse tal complexo poderia ser verdadeiro no passado, quando
Nelson Rodrigues cunhou a expressão, rosnando e espumando em seu reacionarismo.
Mas agora perdeu o sentido, caiu em desuso, os tempos são outros.
Nosso país está diferente. Vejam essas bandeirolas
tremulando. É a Copa das Copas, e o tal complexo de vira-latas deixamos lá
atrás, quando perdemos em casa. Dessa vez, em casa, só ganhamos porque ninguém
vai levar estádio e aeroporto na mala — até porque nem ficou pronto.
Ter Copa em casa nos livra desse sentimento canino de
inferioridade em relação ao resto do mundo. Alguns cães até ladram, mas a Copa
não vai parar. O brasileiro aguarda o início dos jogos com a língua de fora,
vendo pingar na máquina o caldo quente da propaganda. Está embriagado em sua
paixão natural — e legítima, diga-se — pelo esporte. Pega a bolinha, pega.
Mas, roendo a outra ponta do osso, e sem querer ser
hidrófobo, vemos algumas estatísticas que teimam em demonstrar, com o peso
asfixiante dos números, que a propaganda ufanista apelando ao nosso orgulho é
latido oco: o cidadão comum que vive no Brasil está mesmo revirando lixo, mesmo
que não queira se enxergar dessa forma.
Ora, como péssimos cãezinhos amestrados, estamos, por
diversos anos consecutivos, nos últimos lugares em rankings que medem a
educação. O governo consegue gastar 280 bilhões sem ter uma única universidade
entre as cem melhores do mundo.
Estamos na coleira quando o assunto é liberdade econômica.
Somos o 114º país num total de 178, perdendo para o Quênia, Tunísia, Camboja,
Tanzânia e Gabão. E se continuarmos em queda, não demora a chegarmos à
categoria em que se enquadram, pela ordem, Coréia do Norte, Cuba, Zimbábue,
Venezuela e Irã, campeões de repressão econômica.
No índice de desenvolvimento humano ocupamos a 85º posição
entre 186 países. Isso significa que não somos os mais judiados de todos os
cães, mas ainda estamos na rabada, e melhorando pouco.
Somos tosados em nossa liberdade de imprensa, ocupando a
108ª posição entre 179 países, e caindo! A cada oito dias é registrada uma
violação grave à liberdade de expressão no país.
O Brasil é o primeiro dosdez destinos mais perigosos para um
turista. Batemos o nosso próprio recorde de homicídios e temos um número
absoluto de 56.337 mortes violentas por ano. Quem mora em Trinidad e Tobago,
Angola, Quênia, Uganda, Congo, e Ruanda está mais seguro do que você neste
momento. De fato, ninguém sai hoje de casa numa cidade brasileira sem o rabo
entre as pernas.
Se quiser mais sarna para se coçar, confira os índices de
percepção da corrupção,saneamento, saúde, impostos, suicídio epedofilia.
Estou de acordo, presidente: não temos complexo de vira-latas.
Ou, pelo menos, não temos mais o direito à ilusão de nos imaginarmos inferiores
ao resto do mundo. Nós já chegamos lá, na maior parte dos casos. Não é mais um
complexo, é algo passível de demonstração estatística, e por diversos ângulos.
Mundo cão.
Fonte: Mídia Sem Máscara
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Márcio Santana Sobrinho é jornalista.
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