Por Percival Puggina
Só não vê quem não
quer: um STF onde não existam liberais nem conservadores, onde todos, num grau
ou noutro, sejam "progressistas" ou marxistas, selecionados a dedo
pelo mesmo partido, é uma revolução através das togas. Dispensa luta armada ou
desarmada, dispensa Gramsci, movimentos sociais, patrulhamento. Bastam onze
homens e seus votos. E tudo fica parecendo Estado de direito.
A bússola das
decisões normativas sobre a vida nacional, sobre os grandes temas, está saindo
do Congresso, onde opera a representação proporcional da opinião pública.
Aquela história dos três poderes, este faz a lei, aquele executa e aquele outro
julga - lembra-se disso? - vai para as brumas do passado. Há mais de três
décadas estão sendo transferidas para o Judiciário deliberações que vão do
acessório ao essencial, do mais trivial ao mais relevante. Já escrevi muito
sobre tal anomalia e percebo que a migração prossegue, através dos anos, com
determinação e constância.
A judicialização da política, braços dados com o ativismo
judicial, causa imensas preocupações cívicas. Opera uma revolução silenciosa.
Não usa barracas de campanha, não cava trincheiras e não precisa de arsenais.
Ataca a partir de luxuosos gabinetes. Reúne-se em associações e congressos de
magistrados militantes. Seu material bélico está contido em meia dúzia de
princípios constitucionais que disparam para onde a ideologia aponta.
O QG dessa conspiração sofreu uma derrota, terça-feira, com
a aprovação da PEC que postergou para os 75 anos a aposentadoria compulsória dos
magistrados. Mas isso não resolve o problema diante do mal que atacou o caráter
republicano da nossa democracia - o instituto da reeleição - cortando o
movimento pendular do poder. Se o Congresso, e especialmente o Senado, não
reagir, se for aprovada a inacreditável indicação do Dr. Fachin (que até o Lula
teria achado "basista" demais), se aprofundará o abismo entre o
pluralismo como inequívoco princípio constitucional e a composição do STF.
É algo de que, aparentemente, ninguém se deu conta.
Pluralismo é pluralismo. Dispensa interpretação. É um severo princípio impresso
no preâmbulo da Constituição. Como pode ele ser desconsiderado quando se trata
de indicar membros para a mais alta corte do Poder Judiciário (isso para não
falar nos demais tribunais superiores)? É admissível que os membros desse
elevado poder expressem o ideário e os interesses de uma mesma corrente
política? O que a presidência da República vem fazendo e o Senado aprovando é
uma revolução branca, via totalitarismo judiciário. Toleraremos, aqui, o que já
aconteceu na Venezuela?