Por Felipe Moura Brasil – VEJA
A militância gayzista não se conforma que você alerte os
gays (e héteros) contra ela. Se questionar os pressupostos de seu discurso,
então, aí ela pira. A reação histérica ao meu post sobre a propaganda
homossexual continua nas redes, com os xingamentos que apenas confirmam a
intolerância nele descrita. Um site LGBT diz que eu chamo homossexualidade de
neurose e quer me dar aula de redação. Militante é assim: não aprende a ler e
quer ensinar.
Sei que as questões psicológicas são mesmo inconcebíveis
para quem é tão cabeça aberta que deixou o cérebro cair, e mais ainda para os
fanáticos ativistas da genética, mas para todas as outras pessoas segue a
entrevista exclusiva deste blog com a dra. Tania Coelho dos Santos, uma das
psicanalistas mais qualificadas do Brasil e autora de mão cheia, como se vê no
resumo curricular ao fim do post. Que cada um encontre a sua singularidade, em
vez de repetir os chavões da canalhada em busca de poder político. Como alerta
e conclama a doutora:
“Precisamos reagir à coletivização de corações e mentes!”
Felipe Moura Brasil: Uma das bases do discurso dos
militantes gays para reivindicar direitos é afirmar que os gays nascem gays.
Sem entrar na questão política, faz algum sentido essa afirmação feita por
eles? É possível falar em alguma “predisposição” neste sentido? Alguém nasce
hétero?
Dra. Tania Coelho dos Santos: Desde a descoberta freudiana
do inconsciente, que não confundimos mais a diferença anatômica entre os sexos
com a sexualidade psíquica. Nascemos homem ou mulher, anatomicamente falando.
Não nascemos nem homem nem mulher, psicologicamente.
A sexualidade humana não é instintiva nem natural. Somos
seres atravessados pela linguagem, pela cultura e pela civilização. Tornar-se
homem ou mulher é um fato de civilização. Uma criança não vem ao mundo livre e
igual a um adulto.
Ela é esperada (ou não) desejada (ou não) e habita o
discurso de seus pais, muito antes de fazer qualquer escolha subjetiva.
Nascemos como um objeto do desejo do homem. Não nascemos sujeito heterossexual
ou homossexual.
A transmissão do que é ser um homem ou uma mulher, depende
das relações afetivas que os pais estabelecem com seus filhos. Quando a criança
descobre que homens e mulheres não são idênticos, anatomicamente falando, ela
vai buscar as razões dessa diferença no discurso de seus pais.
A diferença é traumática. Não se sabe exatamente o que é ser
um homem ou uma mulher.
É preciso um grande trabalho de elaboração psíquica,
inconsciente, para chegar a se situar em relação à imagem de seu corpo, ao
significante que o designa (homem ou mulher) e ao modo de gozo deste corpo
(feminino ou masculino).
Nem sempre um sujeito alcança conciliar-se seja com sua
imagem, seja com o significante, seja com seu modo de gozo.
Há quem diga: “Eu sou um homem num corpo de mulher” e
vice-versa. “Eu sou uma mulher que amo outra mulher, mas só desejo ser
sexualmente desejada pelos homens.” “Eu sou um homem que desejo outro homem,
sexualmente falando, mas que amo apenas as mulheres.”
Discordâncias íntimas cujo destino deveria ser a experiência
psicanalítica e não os movimentos sociais. Somente a escuta atenta à
singularidade de cada caso pode levar cada um a saber o que fazer com seu sexo.
FMB: Parece comum que as pessoas se agarrem à ideia de que
nasceram de determinado jeito, porque isto as dispensa de maiores esforços
psicológicos. Muita gente se diz tímida, por exemplo, como uma licença para
poder ser mal-educada ou declinar uma responsabilidade qualquer. Dizer-se
homossexual de nascença, sem que haja prova genética alguma disso no caso
específico de quem diz, não é também uma forma de se eximir do esforço, da
análise, da busca da compreensão do sintoma e até mesmo da responsabilidade sobre
as próprias escolhas, sobre o próprio comportamento?
Dra. Tania Coelho: A prova genética de que nascemos
biologicamente homens ou mulheres não nos garante que chegaremos a nos sentir
um homem ou uma mulher. Imagino que, se existe um terceiro sexo, em consequência
do fato de que somos seres de linguagem, estes indivíduos não seriam poupados
do trabalho psíquico de saber o que fazer com sua singularidade sexual.
De fato, vivemos numa época avessa ao esforço intelectual.
Todo mundo sonha em ter tudo pronto. Basta acionar o botão correto. Hoje, o
dever de cada um de saber o que fazer com seu corpo, suas identificações, sua
maneira única de viver e de amar está sendo coletivizado.
Acredita-se que todo mundo deve fazer parte de um grupo
qualquer e cada grupo acredita que tem direitos especiais. A responsabilidade
de cada um para consigo mesmo está sendo substituída pela responsabilidade
social, estatal, assistencial.
Infelizmente não são somente os homossexuais que fogem da
sua singularidade e se refugiam em movimentos coletivos. Esta mentalidade que
esvazia a subjetividade de cada um e tende a nos tratar como um coletivo está
se tornando uma norma de funcionamento social.
Precisamos reagir à coletivização de corações e mentes!
FMB: Boa parte da militância hoje quer fazer crer que
qualquer pessoa que tenha ou possa ter tido algum desejo de ter relação
sexual/amorosa (ou mesmo de “ficar”) com alguém do mesmo sexo, e sobretudo se
chegou a ter de fato, é no fim das contas um homossexual, ou no mínimo bi. A atração
e sobretudo a ereção nesses casos seriam sintomas de que o sujeito não pode ser
heterossexual. Genética, desejo, atração, escolha, comportamento, estilo de
vida, orientação sexual, tudo costuma aparecer muito misturado nos debates
sobre o assunto. Quais são as nuances e distinções básicas que precisam ser
apontadas a respeito?
Dra. Tania Coelho: A sexualidade humana é despertada na
infância de modo perverso e polimorfo. Muito antes do surgimento de sensações
nos órgãos genitais, a boca, o ânus, o olhar e a voz já foram despertados e
funcionam a serviço da satisfação erótica. Antes de interessar-se vivamente
pelo sexo oposto, muitos indivíduos experimentam uma grande satisfação
autoerótica com seu próprio corpo ou com um corpo de um semelhantes.
Perversos, polimorfos, homossexuais, aberrantes, sádicos,
masoquistas, exibicionistas, voyeuristas, coprofílicos, pedófilos,
heterossexuais, tudo isso e mais alguma coisa pode ser dita sobre as
disposições sexuais da espécie humana.
A pergunta que não quer calar é porque muitos seres humanos
apesar de portarem todas esta disposições sexuais em potencial, conseguem se
tornar homens ou mulheres heterossexuais e fazerem sexo “mais ou menos”
convencionalmente.
Por que uma parte da espécie humana deseja copular e fazer
filhos? Este parece que é o grande mistério que precisa ser esclarecido nos
dias de hoje. Talvez a questão não seja porque alguns são homossexuais. Talvez
a grande questão seja, porque tantos outros não o são ?
Perante a genética somos muitos mais parecidos do que
diferentes. Do ponto de vista da sexualidade infantil somos muito mais
parecidos do que diferentes. O que acontece depois? Como nos tornamos aquilo em
que nos tornamos?
Só a experiência analítica, insisto, caso a caso, nos
permite captar o segredo, o mistério da escolha de cada um.
Não existe nenhuma generalização possível. Nem na vida dos
heterossexuais, nem das homossexuais e nem em qualquer outro tipo de
sexualidade que a gente queira inventar.
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*Tania Coelho dos Santos é psicanalista, Membro
da Ecole de la Cause Freudienne, da Escola Brasileira de Psicanálise e da
Associação Mundial de Psicanálise. Presidente do Instituto Sephora de Ensino e
Pesquisa de Orientação Lacaniana, Pós-doutorado no Departamento de Psicanálise
de Paris VIII, Prof. Associada IV do Programa de Pós-graduação em Teoria
Psicanalítica, Pesquisadora bolsista 1C do CNPq e Membro da Associação
Universitária de Pesquisa em Psicopatologia Fundamental. É autora de livros
como Quem tem medo de análise hoje?; Sinthoma: corpo e laco social;
Psicanalise, ciência e discurso; além de organizadora de outros como De que
real se trata na clinica psicanalítica?; A cabeça do brasileiro no divã;
Inovações no ensino e na pesquisa em psicanálise aplicada; e Efeitos
terapêuticos na psicanálise aplicada.