Recapitulemos. O MDB e a ARENA nasceram respectivamente em
março e em abril de 1964, como consequência do bipartidarismo imposto pelo art.
18 do Ato Institucional nº 2. Mais tarde, na transição para os anos 80, com o
início da abertura, novos partidos surgiram e os maiores, que vinham do período
anterior, mudaram de nome. A ARENA virou PDS e o MDB virou PMDB. Durante quase
duas décadas, portanto, os principais partidos brasileiros foram esses dois. Um
pelo governo e o outro pela oposição. Um mais pela direita, o outro mais pela
esquerda. É fato irrecusável, no entanto, que o esforço para levar o país à
normalidade ocorreu no âmbito das instituições, dentro do jogo político, na
conquista da opinião pública, e que a parte principal dessa tarefa coube ao
partido oposicionista, o PMDB.
Simultaneamente, no contrafluxo, algumas dezenas de
organizações comunistas clandestinas cometiam desatinos. Promoviam atos
terroristas e execuções sumárias, assaltavam, assassinavam, sequestravam
pessoas e aeronaves. Recebiam orientação, treinamento e recursos de Cuba, URSS,
China. Davam calor local à Guerra Fria (há quem diga que ela não existia aqui e
que, embora EUA e URSS disputassem até a Lua e o espaço sideral, os soviéticos
olhavam para o insignificante Brasil com desdém). Embora os panfletos que
espalhavam entre os resíduos criminosos e mortais de suas ações falassem muito
em povo, essas organizações não tinham qualquer apoio popular. Semearam dores e
danos, e atrasaram a redemocratização. Descriam da democracia, zombavam dos que
faziam oposição no plano das instituições.
Entretanto, não há como negar a utilidade da atuação do
PMDB. Foi seu trabalho na formação da opinião pública, apoiado por frações da
base governista (parte da qual saiu do PDS e formou a Frente Liberal) que criou
o ambiente favorável à abertura "lenta, gradual e segura" de Geisel.
E é irrecusável, também, que guerrilheiros e terroristas, nessa longa história,
não têm qualquer mérito. Foi a ideologia deles, recusada pelo povo nas ruas do
país, que gerou a intervenção militar e foi a opção deles pela luta armada que
retardou a normalização institucional.
Pois bem, esse é o grupo que, hoje, hegemoniza nossa
política com vários de seus membros promovendo "expropriações" do
patrimônio público e agindo, agora como então, fora da lei. É esse mesmo grupo
que, de tempos para cá, com inacreditável apoio midiático, enfeitando a própria
história, se pavoneia como defensor da democracia e paladino histórico das
liberdades públicas.
Não preciso escrever mais nada para demonstrar que o PMDB
está sendo roubado de seu principal patrimônio político. Líderes vindos da
clandestinidade, da luta errada, por meios errados, para fins ainda mais
errados, chegaram ao poder pelo voto. Instalam-se para ficar. E passam a buscar
méritos que não têm. Posam como vítimas da ditadura (alguns foram mesmo) e
ocultam os tenebrosos objetivos que os moviam. Põem o PMDB a tiracolo e, sem
pedir licença a ninguém, dão de mão no trabalho de Ulysses, Tancredo, Fernando
Henrique, Montoro, Covas, Simon, Teotônio. E o PMDB, submisso à ditadura do
"politicamente correto", submisso à hegemonia petista, a tudo tolera
em troca de quinhões do poder. Alguém tem que ir à delegacia e preencher um
B.O..
______________
*Percival Puggina (69) é arquiteto, empresário, escritor,
titular do site www.puggina.org, colunista de Zero Hora e de dezenas de jornais
e sites no país, autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da
utopia e Pombas e Gaviões, membro do grupo Pensar+.
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