Por Lucas Ferraz enviado Especial ao Rio
TUDO SOBRE A DITADURA MILITAR
GENERAL QUE COMANDOU
EXÉRCITO NA TRANSIÇÃO DEMOCRÁTICA AFIRMA QUE A ESQUERDA VENCEU NO 'TAPETÃO' E
QUE A VERDADE É 'FILHA DO PODER'
General responsável por comandar o Exército durante a
transição democrática, a partir de 1985, Leônidas Pires Gonçalves, 94, não
esconde seu ressentimento com a maneira como a ditadura é vista atualmente.
"A verdade é filha do poder. Nós, militares, nunca
fomos intrusos da história. Mas, infelizmente, a história contada hoje é
mentirosa. Há muita safadeza.", afirma.
O ministro do Exército do governo Sarney defende com ardor o
golpe dado por militares e civis contra o presidente João Goulart, forma para
ele de defender a "liberdade". À época, Leônidas era tenente-coronel
e, por isso, se autodefine como "um dos revolucionários históricos".
Leia trechos da entrevista.
Folha - Passados 50 anos do golpe, por que o Exército ainda
não fez uma autocrítica?
Leônidas Pires Gonçalves - O Exército não é intruso da
história brasileira, mas um instrumento da vontade nacional. Atendemos aos
apelos veementes da sociedade. Se as coisas continuassem como eram no governo
João Goulart, não teríamos democracia nem liberdade. Sou muito feliz por ter
nossa democracia, levamos 20 anos para chegar nela. Está pensando que não sou
democrata? O episódio do comunismo no Brasil, do qual a revolução de 1964 faz
parte, é contado de forma safada. Há safadeza histórica.
Não deveria haver uma análise realista do passado?
Dói para se acabar com um tumor. No começo da revolução,
esperávamos confronto militar. Mas depois vimos que o dispositivo militar do
governo Jango não existia. Jango, aliás, não tinha nada de comunista, era um
bon vivant, fazendeiro. A revolução não é cartesiana. É uma aparente confusão,
mas tem definição bem nítida. Cortamos na própria carne. Fizemos isso e ninguém
lembra. Quantos oficiais foram cassados? Não sei, mas foram centenas.
Isso sem falar na cassação de políticos, torturas e mortes.
A esquerda dominou completamente o pensamento e a mídia. Sua
geração foi impactada pelo veneno da esquerda. O Exército é poder moderador,
garantidor da lei e da ordem. Evitamos a quebra do país. Ninguém fala o que
eles [a esquerda] fizeram, preferem falar da bomba do Riocentro, quando dois
idiotas fizeram aquilo. Fizemos uma coisa civilizada, chamada cassação, que é a
mesma coisa do chamado ostracismo da Grécia. A revolução de 1964 foi
absolutamente democrática. Não tivemos ditador, mas sucessivos presidentes
eleitos. Votação indireta, mas não ilegítima. Todos eleitos pelo Congresso. Já
vi que sua posição é meio esquisita.
Não havia liberdade, eram tempos de exceção.
Se houve algo, foi pressão política. Isso sim. Mas a
revolução não matou ninguém. Eles [a esquerda] montam essas teorias, isso nos
irrita profundamente. O que aconteceu é que a subversão virou radicalmente, o
que era para fazer? Não se esqueça que toda ação tem uma reação igual. Eram
canalhas, matavam, assaltavam bancos e joalherias, no caso do sequestro do
embaixador [americano Charles Elbrick, em 1969], desmoralizou o Brasil perante
o mundo. São canalhas!
A tortura o sr. reconhece?
Houve. Você não controla a raça humana. Não gosto de falar
sobre o tema, não por não me orgulhar do Exército, mas acho que temos problemas
maiores para ficarmos olhando para trás. Você quer parar o país por causa de
quatro, cinco mortos? Ganharam no tapetão. Não querem falar da subversão, só
falam de 1964 a partir do prisma da revolução. Mas a revolução não foi limpinha,
também cometemos equívocos.
Por que o Exército ainda defende militares criminosos?
O militar cumpre ordens. Contra bandido, você não pode fazer
outra coisa. Na hora da guerra, é matar. Não somos pacifistas na hora da
guerra. O soldado é o cidadão de uniforme para exercício cívico da violência.
Por que a Comissão da Verdade incomoda tanto?
Por que a verdade, entre aspas, é filha do poder.
Fonte: A Verdade Sufocada
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