Armando Luiz Malan de Paiva Chaves - Folha de São Paulo
Trinta e um de março de 1964 é uma data histórica.
Interpretá-la cabe a historiadores, em pesquisa isenta, incluindo-se os
testemunhos de quem a viveu. Como eu.
O povo enfrentava carestia. Havia ameaças à propriedade
privada. Quem procurava informar-se via a tensão aumentar. Ninguém acenava com
medida corretiva. João Goulart, então presidente da República, no comício da
Central do Brasil, a 13 de março, acendeu uma fogueira. Embalou a facção
governista e seus apoios sindicais e populares para a guinada à extrema esquerda
havia muito esperada. Em contrapartida, a mídia reagiu, cobrando atitude das
Forças Armadas. No meio político, expectativa, sem planejamento de ação
colegiada. No militar, o legalismo começava a dar lugar à necessidade de
reação.
Em São Paulo, a iniciativa foi das mulheres. Em
impressionante convocação boca a boca, a Campanha da Mulher pela Democracia
promoveu, em 19 de março, a Marcha da Família com Deus pela Liberdade.
Oitocentas mil pessoas em massa compacta caminhando pela cidade.
Castelo Branco, então chefe do Estado-Maior do Exército,
decidiu-se, em 20 de março, por expedir um documento no qual dizia serem
"evidentes duas ameaças": "O advento de uma constituinte para
reformas de base e agitações generalizadas do CGT (Comando Geral dos
Trabalhadores). A ambicionada constituinte é um objetivo revolucionário pela
violência. Para talvez submeter a nação ao comunismo de Moscou? Isso sim é que
seria antipátria, antinação e antipovo. Não, as Forças Armadas não podem
atraiçoar o Brasil". Provocou impacto. Os militares, em maioria,
incorporaram a lição.
Em 25 de março, marinheiros se revoltaram e entraram em
greve. Em decisão política, foram imediatamente anistiados. Era a
desmoralização da autoridade militar.
Em 30 de março, o presidente Goulart compareceu a uma
assembleia do Clube dos Subtenentes e Sargentos. Após ouvir discursos que
punham em xeque a hierarquia, usou a palavra para, ele mesmo, promover e apoiar
a indisciplina.
Foi a gota que faltava para transbordar o cálice de fel
acumulado com tantos desmandos. No dia seguinte, a tropa de Minas Gerais
antecipou-se ao planejamento para pressionar militarmente o governo. Com apoio
do governador Magalhães Pinto, marchou para o Rio de Janeiro decidida a depor o
governo. Era o desembocar da contrarrevolucão e o abandono do cargo por
Goulart.
Seguiu-se a indicação de Castelo Branco para a Presidência
da República. Eleito com 361 dos 388 votos pelo Colégio Eleitoral formado no
Congresso, foi empossado em 15 de abril. Era hora de recompor a ordem.
Os comandantes militares haviam editado ato institucional
pelo qual assumiam autoridade revolucionária sobre os destinos da nação. O
presidente eleito revelou liderança. Voltou-se a executar o plano de governo,
auxiliado por renomados colaboradores. Criados o Banco Central, o Banco
Nacional de Habitação, o Estatuto da Terra, o Instituto de Reforma Agrária e o
Fundo de Garantia do Tempo de Serviço. Unificados os institutos de Previdência
Social.
Cinquenta anos se passaram. Pessoas maduras à época, ainda
lúcidas, têm gravado na memória o que viram, sentiram e como reagiram. Que os
historiadores as consultem.
Fonte: A Verdade Sufocada
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Armando Luiz Malan de Paiva Chaves, 86, é general de
Exército reformado
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