Do site de VEJA
Ex-presidente e atual senador, Fernando Collor de Mello é
absolvido
mais uma vez pelo STF (Reprodução TV Senado)
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Corte livrou o ex-presidente de três acusações e alegou
falta de provas. Ele já respondeu a 14 inquéritos no Supremo e nunca foi
condenado
Quase 22 anos depois de o país protagonizar o principal
capítulo da recente história da democracia brasileira, aprovando o impeachment
do então presidente Fernando Collor de Mello, o Supremo Tribunal Federal (STF)
colocou um ponto final no último processo a que o atual senador alagoano
respondia por irregularidades no período em que ocupou o Palácio do Planalto.
Por unanimidade, o STF considerou não haver provas
suficientes para condenar o parlamentar pelo crime de peculato (uso do cargo
público para desvio de recursos). Denunciado ainda por corrupção passiva e
falsidade ideológica, Collor também não será punido por esses ilícitos porque a
Corte considerou que o caso estava prescrito.
Com a prescrição – os fatos criminosos datam de 1991 e 1992
e só foram julgados em 2014 – o Estado perde o direito de condenar o réu.
No derradeiro processo a que o senador alagoano e
ex-presidente da República responde por fatos relacionados aos 930 dias em que
exerceu poderes presidenciais, o Ministério Público o acusava de liderar uma
rede de corrupção e distribuição de benesses com dinheiro público na época em
que ocupou a Presidência.
O esquema consistia em cobrar propina de empresários para,
por meio de fraudes, permitir que corruptos saíssem vencedores em licitações
para a contratação de serviços de publicidade. De acordo com a acusação, Collor
utilizava prepostos para extorquir dinheiro dos empresários e dava instruções
para que o propinoduto circulasse por meio de contas bancárias de pessoas
fictícias ou de “laranjas”.
Os recursos seriam então utilizados por ele e seus comparsas
para quitar faturas de cartão de crédito, empréstimos bancários, despesas de
hotéis e até a pensão que o ex-presidente pagava para o filho fora do casamento
que teve enquanto era prefeito de Maceió.
“A despeito pela versão da acusação, os depoimentos e
documentos acostados aos autos não apresentam elemento de convicção para a
formação de juízo de certeza, faltando prova irrefutável para demonstrar
materialidade e autoria”, afirmou a relatora do caso, ministra Cármen Lúcia.
Ministros criticam a peça de acusação
No julgamento, os ministros do STF fizeram duras críticas à
peça de acusação feita pelo procurador da República Luís Wanderley Gazoto no
ano 2000 e ainda na 1ª instância.
Para os magistrados, a denúncia não listou provas da
culpabilidade de Collor e ainda alterou o teor de depoimentos de testemunhas e
informantes (testemunha que não assina compromisso de dizer a verdade),
comprometendo a credibilidade do processo.
Para o STF, não houve evidências suficientes para se ter
certeza de que Collor praticou os crimes de que é acusado. Não estava anexado,
por exemplo, quais contratos de licitação teriam sido corrompidos. As
testemunhas também deram versões diferentes na fase de depoimento policial e
quando questionadas pelo juiz.
“Os autos não tem os contratos de publicidade, as licitações
também não estão listadas. Falta o elemento mínimo probatório. Em nenhum
momento se narra qualquer conduta especifica atribuída a Collor, ou nenhuma
ação com propósito de interferir na licitação, não há narrativa de conduta
nenhuma”, disse o advogado de defesa de Collor, Rogério Marcolini.
Na tentativa de convencer os ministros da culpabilidade de
Collor, a vice-procuradora-geral da República Ela Wiecko defendeu que os
ministros aplicassem a controversa Teoria do Domínio do Fato, doutrina em que
se prevê que um réu pode ser condenado quando, pelo cargo que ocupa, tem
ciência da prática dos crimes e poderes para influenciar e paralisar a
atividade ilícita.
“A denúncia imputa a Collor a coautoria e só podemos
considerar isso com a Teoria do Domínio do Fato. Não há nenhuma assinatura
posta pelo então presidente, ou retirada direta pessoal [de dinheiro]. Isso é
feito através de interpostas pessoas por meio de contas fantasmas a partir de
licitações fraudadas”, disse a representante do Ministério Público.
“É triste, não só para o Ministério Público, mas
principalmente para a sociedade brasileira, (…) que num passe de mágica tudo
isso acabe em uma absolvição e que isso não é crime de peculato. É aterrador
como se desvia recursos públicos nesse país. São sucessivos desvios públicos
que continuam assolando o país”, completou ela.
“Só tem o domínio do fato quem tem conhecimento do fato e é
dever do Ministério Público provar que [o réu] conhece [os crimes]. Essa
denúncia não é um primor de denúncia”, criticou a relatora. “A versão do MP
revela contornos de conjectura insuficientes para a condenação. O interesse do
estado é julgar, e não condenar necessariamente ou dar resposta a um anseio de
vingança que eventualmente possa existir”, completou a ministra Cármen Lúcia.
“Para condenação exige-se certeza, não basta probabilidade.
E no caso, a dúvida prevalece em favor do acusado”, disse.
A denúncia contra Fernando Collor foi aceita pela justiça de
1ª instância no ano 2000 e chegou ao STF em 2007, após o político ter tomado
posse como senador e ter conquistado o direito a foro privilegiado. Ficou
parado quase dois anos no gabinete do antigo relator Carlos Alberto Menezes
Direito e desde 2009 estava sob responsabilidade da ministra Cármen Lúcia.
Ao final da sessão plenária, o presidente do STF Joaquim
Barbosa afirmou que a prescrição de crimes, como no caso de Collor, são um
“retrato de como funciona a justiça criminal brasileira” e disse que “tropeços”
e “dificuldades” atrasam a conclusão dos casos.
O caso – Em um dos episódios de pagamento de propina
descritos pelo MP, o empresário Chucre Said, sócio da SR Publicidade e
Promoções Ltda, declarou ter sido procurado por Osvaldo Sales, então adjunto da
Secretaria Particular da Presidência e “testa-de-ferro” de Collor.
Os recursos arrecadados com a propina empresarial eram, ao
final, utilizados para pagamentos de despesas pessoais de Collor, Osvaldo Sales
e do advogado Claudio Vieira, então secretário particular do presidente.
Em dezembro de 1992, quando Collor foi absolvido pelo
Supremo no principal processo a que respondeu por participação no esquema PC
Farias, a maioria dos ministros considerou que não havia provas de que o
ex-presidente tivesse praticado “ato de ofício” que confirmasse os crimes, ou seja,
que não havia evidências de que ele tivesse solicitado, aceitado ou recebido
benefícios do corruptor e oferecesse algo em troca ao alcance das atribuições
do seu cargo, o chamado “ato de ofício”.
Naquela época, foi comprovado, entre outros episódios, que o
célebre Fiat Elba de Collor havia sido comprado com dinheiro levantado do
esquema PC Farias, mas o Supremo considerou que faltava registro da retribuição
do ex-presidente ao presente recebido.
Com o recente julgamento do mensalão, porém, a interpretação
da Corte sobre o ato de ofício e o crime de corrupção ficou mais clara, já que
o artigo 317 do Código Penal, que descreve o crime de corrupção passiva, não
exige que o agente público tenha praticado o ato criminoso em si, prevendo que
a corrupção já se caracteriza quando existe a simples solicitação da vantagem
indevida.
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