Nas conversas interceptadas pela Polícia Federal no âmbito
da Operação Lava Jato, o doleiro Alberto Youssef e o vice-presidente da Câmara,
André Vargas, demonstram ter muito mais do que uma relação de amizade. Em quase
cinquenta mensagens registradas pela PF, Vargas recebe orientações do doleiro,
combina reuniões com Youssef e chega a passar informações das conversas que
ele, como parlamentar do PT, mantinha com integrantes do governo. Como é
natural nesses diálogos nem sempre edificantes flagrados pela polícia, Vargas e
Youssef adotam a precaução de conversar em códigos. Para Polícia Federal, no
entanto, os registros colhidos na operação mostram que Vargas faz parte de
projetos de Youssef e usa sua influência no governo em benefício do parceiro.
Nas mensagens obtidas pela polícia, Vargas e Youssef tratam
de interesses do laboratório Labogen Química Fina e Biotecnologia no Ministério
da Saúde. Como VEJA revelou há duas semanas, a Labogen é uma das empresas do
esquema do doleiro. A Polícia Federal já descobriu que a empresa – que está no
nome de um laranja de Youssef e é tudo menos um laboratório farmacêutico – já
havia conseguido fechar uma parceria com o Ministério da Saúde pela qual
receberia 150 milhões de reais em vendas de remédios para o governo.
No dia 26 de fevereiro deste ano, Vargas escreve para
Yousseff: “Reunião com Gadelha foi boa demais... Ele garantiu que vai nos
ajudar, que sabe da importância, e encaminhou reunião decisiva dia 18, mas
pediu que entregássemos os medicamentos da primeira PDP (Parceria para o
Desenvolvimento Produtivo) e concluíssemos Anvisa, boas práticas aqui em BSB”.
O doleiro elogia o empenho de Vargas: “Que bom. Parabéns.” E diz que já estão
prontos para a Anvisa. “Muito bom”, finaliza Vargas.
Para a Polícia Federal os termos da conversa não deixam
dúvidas: “Os indícios presentes nesta conversa apontam que o interlocutor não
identificado (André Vargas) faz parte do projeto da Labogen junto ao Ministério
da Saúde, e possivelmente atua exercendo influência junto aos responsáveis pela
contratação do governo.” Falando sempre em códigos, André Vargas e o doleiro
falam da necessidade de marcar uma reunião com um interlocutor identificado por
Vargas pelas iniciais “PP”. Aparece na conversa também o nome de um certo
“Marcos”.
No dia 7 de março, outra conversa chama atenção dos
investigadores. Até então, os agentes da Polícia Federal consideravam a
possibilidade de André Vargas ser apenas um homônimo do vice-presidente da
Câmara. As evidências de que se trata mesmo do deputado federal petista
aparecem quando o próprio Vargas combina um encontro com Youssef: “Quer fazer
eu, você e Marcos segunda de noite em Brasília (sic)?”, pergunta o doleiro.
“Tenho reunião com deputados. PP falou de fazermos na quinta”, responde André
Vargas. “A partir dessa afirmação, ficam contundentes os indícios de que o
interlocutor possui contatos no Congresso, pois tem marcada uma reunião com
deputados, provavelmente em Brasília”, registra a PF no relatório.
Ainda segundo a PF, as negociações entre André Vargas e o
doleiro no Ministério da Saúde eram realizadas a partir do secretário de
Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos do ministério, Carlos Augusto
Grabois Gadelha, e de Eduardo Jorge Valadares, diretor do Departamento do
Complexo Industrial e Inovação em Saúde da Secretaria de Ciência, Tecnologia e
Insumos Estratégicos, órgão do Ministério da Saúde. Além dos servidores, o
próprio ex-ministro da Saúde Alexandre Padilha, atualmente pré-candidato
petista ao governo de São Paulo, é citado nominalmente no inquérito da Polícia
Federal justamente por ter assinado o contrato com o laboratório do doleiro.
Ao jornal Folha de S.Paulo, que revelou parte das conversas
hoje, Vargas negou qualquer contato com os servidores citados pela Polícia
Federal. Na semana passada, porém, o vice-presidente da Câmara também negava
ter participado de qualquer reunião com o doleiro em Brasília ou intermediado
qualquer interesse de Youssef. “Eu só conversava com o Youssef em Londrina, no
aeroporto ou num posto de gasolina. Como eu sou um cara que tenho muita
influência no partido do governo, ele queria saber o que estava acontecendo na
política, na economia. Ele queria saber dos cenários econômicos, políticos e eu
só dava os meus pitacos”, disse Vargas. Com o lobby e as reuniões de Vargas em
favor do doleiro escancaradas, tem-se agora a demonstração do que pode estar
por trás de um simples “pitaco”. (VEJA)
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