sexta-feira, 30 de maio de 2014

Esquerda e direita

Por David Coimbra - Zero Hora

Entre esquerda e direita, prefiro a esquerda. A esquerda faz uma ideia generosa da vida, de defesa do fraco contra o forte. Mas as pessoas de esquerda têm um defeito irritante: o hábito de julgar os outros por suas ideias. Para muitas pessoas de esquerda, quem não pensa como elas é desprezível.

Ideias têm alguma importância. Não muita. Conheço supremos canalhas que são esquerdistas perfeitos. O que torna um ser humano melhor não são suas ideias; são os seus sentimentos e o seu comportamento, sobretudo a forma como trata os outros seres humanos.

O Brasil é governado há meia geração por um partido de esquerda. O PT seria a nêmesis da ditadura militar, a direita mais renhida. Mas, olhando para um e outra, me espanto: como são parecidos! Hoje encontro gente agradecida ao PT pelos ótimos Bolsa Família, Minha Casa eProUni, e lembro que só cursei minha faculdade graças ao Crédito Educativo e que minha mãe só comprou nosso apartamento graças ao BNH. Deveríamos ser agradecidos à ditadura? Os dois, PT e ditadura, tentaram diminuir as diferenças sociais por meio de programas, não com mudanças de sistema.

Ambos, PT e ditadura, são desenvolvimentistas, o PAC é o PND. A ditadura fez a ponte Rio-Niterói, a Transamazônica, a Freeway, o Pólo Petroquímico, a Usina de Itaipu. O PT quer fazer Belos Montes, compra usinas no Exterior, duplica a BR-101, planeja a segunda ponte do Guaíba, pretende terminar a transposição do São Francisco. Em Porto Alegre, a esquerda tem feroz apreço pelo 1 milhão e 400 mil árvores da cidade. Destas, 1 milhão e 100 mil foram plantadas na gestão de Socias Villela, prefeito nomeado pela ditadura. Na ditadura, a imprensa era censurada. O PT sonha com a censura disfarçada pelo "controle social da mídia". O PT e a ditadura são estatizantes, os dois apostaram na indústria automobilística como pilar de desenvolvimento e tiveram seus empresários-modelo, seja os financiadores da Oban nos anos 70, seja Eike e seus R$ 10 bilhões captados junto ao BNDES nos 2000.

Lula aproveitou o bom momento econômico internacional e fez o Brasil crescer até 7,5%. Semelhante a Médici, que levou o país a 10%. Depois de Médici, assim como depois de Lula, a economia virou. Seus sucessores, Geisel e Dilma, tiveram de enfrentar momentos delicados e um país em princípio de ruptura social. Sarney e Maluf, velhos próceres do PDS, o partido da ditadura, são eleitores entusiasmados do PT, embora Maluf reclame que o PT esteja à sua direita.

Mas nem a esquerda nem a direita aproveitaram seus bons momentos para fazer reformas estruturais. Quanto mais rico fica o Brasil, mais degenerado se torna como nação. Na ditadura e na gestão do PT, o Brasil melhorou para milhões de indivíduos; piorou como país. Foram medidas analgésicas, não curativas. Não por má intenção, diga-se. Houve, sim, vontade de fazer o melhor. Por isso, não me agradam petistas que não enxergam decência fora do PT e não me agrada quem chama os petistas de petralhas. Melhor seria se compreendessem que tanto à esquerda quanto à direita há gente, muita gente, que quer o bem do Brasil. É este o sentimento mais importante. Porque na prática, como se vê, não faz muita diferença.



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