Morrem cerca de 50 mil pessoas assassinadas por ano no
Brasil, resultado evidente de um governo que fomenta a criminalidade, de
legisladores que protegem os bandidos e da hegemonia cultural esquerdista que
alçou ambos ao poder, com seus “pensadores” que legitimam moralmente os crimes
e atacam as forças policiais, sobretudo se militares, projetando contra as
instituições os erros, excessos e, sim, crimes que eventualmente cometem, como
em qualquer outra instituição humana, alguns de seus homens.
Isto sem que esses pensadores – e os políticos que os
macaqueiam – jamais se pronunciem quando morre um policial, como acontece a
cada 32 horas no país.
É preciso expor os nossos problemas de segurança pública.
Delegados e agentes estão se
engalfinhando até agora na seção de comentários deste blog, porque escrevi aqui
sobre a crise da Polícia Federal e as manifestações dos EPAS (escrivães,
papiloscopistas e agentes), cuja pauta – a despeito de pontos aparentemente
justos – inclui a PEC 51, de autoria de Lindbergh Farias (PT), que ora tramita
no Senado e que – também a despeito de pontos aparentemente justos – propõe a
desmilitarização da PM.
Minha questão é: como pode boa parte dos EPAs lutar ao mesmo
tempo contra a instrumentalização da PF pelo PT e a favor do projeto de um
petista que, seguindo a cartilha da ONU, centraliza ainda mais o poder federal,
como aconteceu na Venezuela de Chávez e Maduro? Em nome da reestruturação da
carreira, os agentes estão dispostos a fornecer este imenso poder ao adversário
que agora denunciam? Ou eles não o teriam?
Não me venham com a conversa mole de que a proposta deve ser
discutida sem partidarismos, ao mesmo tempo em que condenam a “ideologia
militar” e o “legado ditatorial” da PM, com um discurso inteiramente
contaminado de ideologia esquerdista em seu sentido mais embusteiro, ou seja,
psolista. Eu quero saber é qual a proteção que a população brasileira teria
contra o controle do governo federal sobre as polícias, inclusive no que
concerne à inoculação de uma ideologia infinitamente mais perniciosa que os
valores militares na formação dos novos policiais.
Seguem abaixo duas críticas fundamentais à desmilitarização
da PM que reforçam esses pontos:
Item I – No programa “Tratamento de Choque” da Rádio Vox,
que transcrevo de forma resumida, Diogo Fontana mostra o perigo de entregar 500
mil homens armados nas mãos do PT;
Item II – O sociólogo e jornalista José Maria e Silva
contextualiza a polêmica em artigo, com todas as suas questões acadêmicas,
culturais, vocacionais, institucionais e prisionais que a propaganda das partes
interessadas sempre encobre.
Por fim, um vídeo de Paulo Eduardo Martins, só para colocar
a ONU no seu devido lugar.
O blog está aberto para este debate complexo, o que não quer
dizer que vai aprovar as infâmias de militantes histéricos.
I.
O perigo da desmilitarização da polícia: 500 mil homens
armados nas mãos do PT
DIOGO FONTANA: (…) O fim da PM é uma bandeira que foi lançada de forma publicitária no filme “Tropa de Elite 2″, que foi feito por psolistas para o PSOL e para a esquerda.
Na cena final, o Capitão Nascimento fala: “A PM do Rio tem
que acabar.”
…Então soltaram esta ideia, que vem crescendo. Ela ganhou as ruas com os Black Blocs e outros apadrinhados do PT e já virou Proposta de Emenda Constitucional.
É a PEC-51 criada pelo senador Lindbergh Farias, do PT. Essa
PEC visa a desmilitarização da Polícia Militar.
Antes disso, eu quero explicar como funcionam as Forças
Armadas no Brasil.
O efetivo atual é o seguinte:
Forças Armadas (Exército, Marinha e Aeronáutica) - 370 mil
homens (servindo agora);
Forças de Reserva – 1 milhão de homens.
Desse 1 milhão, mais ou menos metade são pessoas que já
serviram o Exército – desde o sujeito de 45 anos que serviu quando tinha 18 até
o cara que serviu no ano passado.
São pessoas que tiveram pelo menos um ano de treinamento
militar, mas que estão em casa, fora de forma etc. Custa dinheiro e muito
esforço mobilizar e treinar esse pessoal e provavelmente nem existe arma
disponível para todos eles.
Os outros 500 mil das Forças de Reserva são justamente os
policiais militares de todos os estados do Brasil. Ou seja: metade da Reserva é
a PM.
O que é que o PT está propondo, através de Lindbergh Farias?
Acabar com metade das Forças de Reserva das Forças Armadas.
Eles querem amputar quase 40% do tamanho das Forças Armadas.
É isto que eles estão fazendo. Quando você ouvir alguém falando em fim da PM,
entenda: eles querem cortar quase pela metade o tamanho das Forças Armadas
brasileiras.
Se tirar essa polícia, vão colocar outra: uma polícia civil
unificada, estadual.
A lei prevê organização municipal da polícia, organização
metropolitana, setorial, isto até seria interessante, se não fosse uma
artimanha…
As polícias civis unificadas vão ser estaduais, sob o
comando do estado, mas a armadilha é a seguinte: mesmo havendo uma
multiplicidade de forças policiais neste novo modelo, todas elas serão
submetidas a diretrizes federais.
Ou seja: o Governo Federal vai ditar as regras. Vai ter a
polícia metropolitana de São Paulo, do Rio, de Sergipe, em cada estado, mas
todas elas vão obedecer no fim das contas a um Ministério em Brasília. Ou seja:
centraliza o poder ainda mais.
Querem substituir cerca de 500 mil homens sob o comando das
Forças Armadas por 500 mil homens dirigidos de Brasília, em última instância
pelo Poder Executivo.
Com mais um detalhe:
As instituições de formação dessas novas forças policiais
serão também deferais, ou seja: vai ser a oportunidade perfeita de inocular
também ideologia na cabeça dos oficiais.
De uma hora para outra, com muita rapidez, o PT vai ter 500
mil homens armados.
Por isto que eu falei: fujam! Se isto acontecer, é “game
over” mesmo.
As Forças Armadas estão estado de penúria, sucateadas, os
370 mil homens têm hoje poucos recursos e equipamentos, enquanto que os novos
vão certamente receber muito mais investimentos e vão estar praticamente sob o
comando de Brasília. O PT vai garantir para si o comando bélico do Brasil.
Vai quebrar a espinha das Forças Armadas, cuja resistência
se não for inócua, estará muito fragilizada.
De largada, já vai haver uma desvantagem númerica dos homens
da ativa. São 370 mil das três Forças Armadas contra o efetivo inicial de 500
mil na ativa sob o comando do Executivo.
É o controle militar do país. É o golpe final nas Forças
Armadas. Isso aí é muito importante e muito perigoso.
Os governadores nominalmente vão ter o poder sobre os seus
efetivos policiais, mas as diretrizes vão ser federais e quem vai estar
inoculando ideologia serão as escolas federais também. Os policiais vão
obedecer a Brasília, isto é lógico.
II.
A falácia da desmilitarização da polícia
José Maria e Silva (nov/2013)
Criar um “SUS” da segurança pública, unificar as polícias e
despir a PM de sua farda – eis as propostas que prometem revolucionar a
segurança pública no País. Praticamente unânimes entre os acadêmicos
especializados na área, essas ideias conquistam cada vez mais adeptos em
Brasília. É o que se percebe nas discussões da Comissão Especial de Segurança
Pública do Senado, instalada em 2 de outubro deste ano com o objetivo de
debater e propor soluções para o financiamento da segurança pública no Brasil.
Criada por iniciativa do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), a
comissão é presidida pelo senador Vital do Rêgo (PMDB-PB) e tem como relator o
senador Pedro Taques (PDT-MT).
“O sistema de segurança pública no Brasil está absolutamente
falido” – com essa declaração, proferida numa audiência pública realizada no
dia 13 de novembro último, o senador Pedro Taques resumiu um sentimento das
ruas que hoje encontra guarida até nos quartéis. Cada vez mais estão surgindo
depoimentos de policiais militares colocando em descrédito a própria corporação
a que pertencem. É o caso do livro O Guardião da Cidade (Editora Escrituras,
2013, 256 páginas), do tenente-coronel Adilson Paes de Souza, fruto de sua
dissertação de mestrado “A Educação em Direitos Humanos na Polícia Militar”,
defendida na Faculdade de Direito da USP em 2012, sob a orientação do cientista
político Celso Lafer.
Nesse trabalho acadêmico, festejado por toda a imprensa, o
tenente-coronel da PM paulista defende a ampliação da carga horária do estudo
de direitos humanos na formação dos oficiais da Polícia Militar, como forma de
combater a tortura. Em artigo anterior, procurei demonstrar que se trata de uma
falácia. O Curso de Formação de Oficiais é praticamente um curso completo de
Direito e, como se sabe, é impossível estudar qualquer disciplina do Direito
sem tratar dos direitos humanos, uma vez que a Constituição de 88, base legal
de todas as disciplinas jurídicas, é alicerçada, de ponta a ponta, nos direitos
da pessoa humana.
Sobrevivendo na Gestapo brasileira
Em vários momentos do livro, influenciado por pensadores de
esquerda, que vêm na polícia um braço armado do sistema capitalista, Paes de
Souza, de modo quase indisfarçável, compara a Polícia Militar brasileira com a
Gestapo de Adolf Hitler. Chega a descrever o produto das ações da PM como um
novo campo de concentração nazista. Com base em artigo da psicóloga e
psicanalista Maria Auxiliadora de Almeida Cunha Arantes, sintomaticamente
intitulado “Violência, Massacre, Execuções Sumárias e Tortura”, o tenente-coronel
cita como exemplo desses casos, os 111 mortos do Carandiru, em 1992, os 493
mortos quando dos ataques do PCC em 2006 e a Operação Castelinho em 2002, “que
constituiu uma emboscada”, com 12 mortos – todos bandidos do PCC,
acrescente-se, já que o coronel não o faz em sua tese.
Para a psicóloga Maria Auxiliadora Arantes, citada no livro
O Guardião da Cidade, tais acontecimentos “são crimes filhotes de um Estado que
deixou intacto um aparelho de matar e que não puniu os que o montaram”. O tenente-coronel
Adilson Paes de Souza corrobora literalmente suas palavras, tanto que
acrescenta a elas a seguinte frase: “De fato, Auschwitz faz-se presente”.
Reparem: Paes de Souza está comparando o trabalho da Polícia Militar –
instituição em que atuou durante 28 anos, chegando a tenente-coronel – com a
violência das forças nazistas nos campos de concentração de Hitler. Justamente
num momento em que a PM está sob o fogo cerrado dos formadores de opinião.
O cientista político Celso Lafer, responsável pela dissertação
de mestrado de Adilson Paes de Souza na USP, deveria ter-lhe feito uma pergunta
singela antes de aceitar a orientação de seu trabalho: “Onde o senhor estava,
na condição de tenente-coronel da Polícia Militar, quando seus subordinados de
farda se tornaram exemplos atuais da Gestapo de Hitler, torturando e executando
pessoas?” Antes de pontificar sobre os problemas da Polícia Militar,
apresentando soluções mirabolantes do conforto de uma cátedra universitária, o
tenente-coronel deveria ter respondido para si mesmo essa pergunta. Na condição
de tenente-coronel da Gestapo brasileira (a se crer nos seus próprios
conceitos), ou Paes de Souza foi cúmplice do holocausto que denuncia ou foi
omisso diante dessa carnificina que imputa à PM. Em qualquer dos casos, deveria
refletir com mais profundidade sobre o assunto, antes de se arvorar a defender
tese, escrever livro e contribuir, ainda que involuntariamente, para a
difamação sistemática de que a PM é vítima na imprensa e nas universidades.
Não é possível sobreviver durante 28 anos num aterro
sanitário moral e dele sair com a alma cheirando a talco, como canta Gilberto
Gil. Em seu livro, citando o economista Albert Hirschman, Paes de Souza fala
que os membros de uma instituição podem abandoná-la ou criticá-la quando se
sentem descontentes. O autor não diz, mas, no caso da Polícia Militar, a via
mais frequente é a omissão: o policial se esconde numa carreira burocrática,
evitando o confronto das ruas e, com isso, pode pontificar sobre direitos
humanos sem correr riscos. O tenente-coronel sobreviveu ao horror que denuncia
foi por essa terceira via? Sem essa explicação, suas reflexões e denúncias
sobre a PM perdem muito da autoridade que poderiam ter.
Depoimentos de PM homicidas
Para exemplificar as críticas que faz à polícia, Adilson
Paes de Souza colheu o depoimento de dois policiais militares condenados por
homicídio e se valeu também de dois depoimentos colhidos pelo jornalista Bruno
Paes Manso, do jornal O Estado de S. Paulo. Em junho de 2012, Manso defendeu no
Departamento de Ciências Políticas da USP a tese de doutorado “Crescimento e
Queda dos Homicídios em São Paulo entre 1960 e 2010”, em que faz uma “análise
dos mecanismos da escolha homicida e das carreiras no crime”. Essa tese de
Manso já havia lhe rendido o livro O Homem X: Uma Reportagem sobre a Alma do
Assassino em São Paulo (Editora Record, 2005), no qual o tenente-coronel buscou
os dois depoimentos.
Os policiais ouvidos por Paes de Souza ganharam os apelidos
de “Steve” e “Mike”, geralmente dados aos policiais que trabalham nas ruas. O
policial Steve foi condenado a mais de 20 anos de reclusão por um homicídio a
tiros e facadas. “No auge da prática do ato, senti que estava cheio de ódio e
acabei descarregando tudo sobre o corpo da vítima. Tinha um sentimento de ódio
generalizado de tudo”, afirma o policial. De origem nordestina, ele contou que
seu pai era PM aposentado e costumava conversar com toda a família na hora do
jantar sobre o sentimento de honra que envolvia a profissão. Inspirando-se no
pai, Steve, ao completar 18 anos, ingressou na polícia, por meio de concurso
público.
“Fui designado para trabalhar numa unidade da Polícia
Militar na periferia da cidade de São Paulo. Comecei a ver uma realidade que
não conhecia: favelas, meninas estupradas, pessoas pobres vítimas de roubo, o
que causou revolta”, conta Steve. Movido por essa revolta, diz que começou a
trabalhar além do horário normal, prendendo o máximo possível de bandidos, na
esperança de acabar com a criminalidade na região. O PM conta que, numa
ocasião, prendeu em flagrante dois ladrões que tinham roubado um supermercado,
mas na noite do mesmo dia viu os dois na rua. Quando os abordou, soube que
fizeram um acordo com o delegado, inclusive deixando na delegacia uma parte da
propina para o policial.
“Nesse momento, percebi que a corrupção existente nos
distritos policiais da área onde trabalhava gerava a impunidade dos
delinquentes”, afirma Steve, que passou a frequentar velórios de policiais
mortos em serviço, alimentando ainda mais sua revolta com a impunidade dos
bandidos. Foi aí que decidiu fazer justiça com a própria farda: “Eu era juiz,
promotor e advogado. Levava a vítima para um matagal, concedia-lhe um minuto
para oração e a sentenciava a morte”. Essa vida de justiceiro fardado destruiu
sua família. Sua mulher chegou a tentar o suicídio. E, na cadeia, sofreu
maus-tratos e não teve a solidariedade dos colegas: os policiais que o
visitavam estavam mais preocupados em sondá-lo para saber se não seriam
delatados, em virtude de outras ocorrências.
Um dos entrevistados pelo repórter Bruno Paes Manso, citado
na dissertação do tenente-coronel Paes de Souza, também relata que se via em
guerra contra os criminosos e, movido pelo ideal de resolver o problema da
criminalidade, trabalhava praticamente o dobro: as oito horas regulamentares
pagas pelo Estado somadas às oito em que combatia o crime de graça, por sua
própria conta e risco. Esse policial contou ter deparado com vários casos
graves, que só via em filmes. Certa vez, atendeu a uma ocorrência em que uma
criança de quatro anos foi estuprada e ele, junto com outros policiais
militares, evitou o linchamento do estuprador. “Nesse momento, achou um
contrassenso ter que proteger quem havia praticado uma monstruosidade contra
uma menina. Sentiu revolta”, relata Paes de Souza.
Mais confrontos, mais mortes
Esse é praticamente o padrão dos depoimentos de policiais
militares condenados por homicídio: 1) imersão idealista do policial no combate
ao crime; 2) revolta com a impunidade dos criminosos; 3) justiça com a própria
farda; 4) prisão, arrependimento e transferência da culpa para a corporação
militar. O livro Sangue Azul (Editora Geração Editorial, 2009), baseado no
depoimento de um soldado da PM do Rio de Janeiro ao documentarista Leonardo
Gudel, também segue esse padrão. E, de acordo com as entrevistas concedidas
pelo autor, parece que o recém-lançado Como Nascem os Monstros (Editora
Topbooks, 2013, 606 páginas), romance do policial carioca Rodrigo Nogueira,
condenado e preso por homicídio, também não foge à regra.
Um sargento preso por homicídio e ouvido por Bruno Paes
Manso explica que o “assassinato é uma importante ferramenta no cotidiano
perigoso do policial militar que trabalha na rua”, e acrescenta que “se os
policiais fossem proibidos de matar seria melhor que parassem de trabalhar”.
Esse mesmo policial diz ainda: “Sem contar que a bandidagem está cada vez
ficando mais ousada, mais armada e respeita cada vez menos a polícia. Isso é
explicado dessa forma, isso não foi a polícia que motivou. Hoje tem muito mais
reação, o pessoal enfrenta, por isso tem mais morte”. O tenente-coronel Paes de
Souza, do alto de sua tese da USP, classifica essa fala do sargento como
simplista, por afirmar que mais criminalidade significa mais confronto e,
consequentemente, mais mortes.
Ora, simplista é o modo como o tenente-coronel, desprezando
seus 28 anos de experiência como policial, deixa-se seduzir pela inútil
retórica da academia e utiliza esses depoimentos para corroborar teses
injuriosas a respeito da Polícia Militar, que a acusam de ser uma máquina
assassina, nazista, semelhante a Auschwitz. Quando atribuem à Polícia Militar o
suposto “genocídio da juventude negra”, calúnia que já foi corroborada até por
membros do Poder Judiciário, os acadêmicos escondem dois detalhes cruciais:
primeiro, muitos jovens negros das periferias são recrutados pelo narcotráfico
e matar ou morrer são verbos que conjugam diariamente; segundo, a Polícia
Militar emprega muito mais negros do que as universidades que a criticam.
Então, a ser verdade o que diz a academia, esses policiais não seriam
genocidas, mas suicidas: estariam matando deliberadamente seus próprios
familiares.
O tenente-coronel e os demais acadêmicos que escrevem teses
sobre segurança pública acreditam que basta perorar sobre direitos humanos no
ouvido de um soldado para que ele saia à rua com flores na boca do fuzil,
ajudando velhinhas no semáforo e pegando crianças no colo, até que surja um
marginal armado e esse policial, consciente de seus deveres, saque da farda um
exemplar da Constituição e atire no rosto do bandido seus direitos humanos,
para que o criminoso estenda os pulsos com cidadania e seja algemado com
dignidade. É óbvio que a terrível complexidade da segurança pública não se
rende a golpes de retórica sobre direitos humanos.
Policial só se equipara a médico
Uma análise verdadeiramente profunda dos depoimentos dos
homicidas da PM revela a complexa natureza do trabalho policial, que, em
qualquer tempo e lugar, é inevitavelmente insalubre para a alma. O policial é
como o médico: sem uma dose sobre-humana de frieza, ele não será capaz de
proteger vida nenhuma, pois o medo do sangue, da mutilação, do cadáver, irá
acovardá-lo diante do dever a ser cumprido. Por isso, ser policial não é para
qualquer um. Os policiais homicidas tentam enganar a própria consciência quando
dizem que a corporação os transformou em violentos. O potencial de violência já
estava presente neles ou não teriam sonhado em ser policial, uma profissão que,
em algum momento, há de exigir violência para que as leis sejam cumpridas.
Afinal, se bandido ouvisse conselho, não entraria no crime.
Polícia não é assistência – é contenção. Ela é chamada
justamente quando as normas da cultura e os mandamentos da lei já não são
suficientes para manter o indivíduo no bom caminho e alguém precisa contê-lo.
Por isso, a polícia tem de ser viril. A testosterona que faz o bandido violento
é a mesma que faz o policial corajoso. Daí a importância de se separar
ontologicamente o policial do criminoso. Ao contrário do que acreditam os
acadêmicos, o policial tem que tratar o bandido como inimigo, sim. O soldo
sozinho – por maior que seja – não é capaz de separar o policial do criminoso,
pois a natureza mais profunda de ambos e o ambiente em que vivem se alimentam
da mesma virilidade masculina, responsável por mais de 90% dos crimes violentos
em qualquer cultura humana em todos os tempos.
O policial de rua, obrigado a enfrentar o crime de arma em
punho e não de uma sala refrigerada da USP, é como um médico num campo de
refugiados ou em meio a uma epidemia letal: se trabalhar só pelo dinheiro, ele
voltará para casa na hora, pois não há salário que pague sua própria vida,
permanentemente em risco. Para compensar os riscos da profissão, o policial
precisa ser tratado como herói. Especialmente num país como o Brasil em que a
criminalidade soma cerca de 63 mil homicídios por ano (de acordo com estudos do
Ipea). O policial precisa ter a certeza de que, ao tombar no campo de batalha,
sua morte não será em vão: a sociedade irá cultuá-lo como herói diante de sua
família enlutada e o bandido que o matou será severamente punido.
No Brasil, ocorre justamente o contrário: enquanto a morte
de bandidos é cercada de atenção pelas ONGs dos direitos humanos e gera
violentos protestos de rua em São Paulo e Rio, a morte de um policial não passa
de uma efêmera nota de rodapé no noticiário e, em muitos casos, sua família não
recebe nem mesmo a visita das autoridades da própria segurança pública,
temerosas do que possam pensar os formadores de opinião. Já em países como os
Estados Unidos, um bandido reluta em matar um policial, pois sabe que o
assassinato será motivo de comoção pública e a pena que o aguarda será à altura
dessa indignação cívica com a morte de um agente da lei.
Completa inversão de valores
Mas não basta tratar como herói o policial – também é
preciso tratar o bandido como bandido. O ser humano é um ser relativo e não
consegue julgar em absoluto, mas somente por meio de comparação. Por isso, ao
mesmo tempo em que se enaltece o policial corajoso e honesto, é preciso punir
verdadeiramente o criminoso, para marcar a diferença entre ambos. O policial se
revolta ao proteger de linchamento o estuprador de uma criança ou ao levar para
o hospital o bandido ferido que tentou matá-lo porque sabe que seu trabalho
heroico e humanitário foi inútil: logo, esses bandidos serão postos na rua para
cometer novos homicídios e estupros.
Mesmo o estuprador de uma criança ou o homicida que queima
viva sua vítima têm direito a todas as regalias da legislação penal,
travestidas de direitos humanos. Até criminosos que matam ou estupram mulheres
gozam de benefícios absurdos, como a famigerada visita íntima. A Resolução
CNPCP Nº 4, de 29 de junho de 2011, do Conselho Nacional de Política Criminal e
Penitenciária, instituiu de vez a visita íntima como um direito do preso
qualquer que seja a gravidade do seu crime. No seu artigo 4º, a resolução deixa
claro que “a visita íntima não deve ser proibida ou suspensa a título de sanção
disciplinar”; ou seja, mesmo se o preso promover rebeliões e mortes na cadeia,
a visita íntima continuará sendo assegurada a ele como um direito sagrado, à
custa da segurança da sociedade. É óbvio que a mulher que se presta a lhe
servir de repasto sexual também há de lhe fazer outros favores associados
diretamente ao crime, como passar recados para seus comparsas que estão fora
das grades.
É por isso que quando uma patrulha da PM leva um criminoso
ferido para o hospital, muitas vezes junto com um policial também ferido na
troca de tiros, os policias que assim agem precisam ser tratados como heróis. É
sua única recompensa. Não há salário que pague esse gesto. Não é fácil para
nenhum ser humano salvar a vida de seu próprio algoz sabendo que aquele
criminoso que tentou matá-lo não será punido como merece, pois, na cadeia,
continuará comandando o crime, com direito a saídas temporárias, visitas
íntimas e outras regalias. A legislação penal é tão moralmente hedionda que um
dos assassinos do jornalista Tim Lopes, depois de preso, jogou água quente em
sua companheira dentro da própria cela. E esse novo crime bárbaro só foi
possível porque o Estado brasileiro – cúmplice contumaz de bandidos – garante a
famigerada visita íntima até para um monstro dessa espécie.
Feministas contra a polícia
Mas, por incrível que pareça, até as feministas – que
criticam violentamente a polícia – defendem as visitas íntimas para presos,
consideradas uma extensão dos direitos humanos e classificadas como “direitos
sexuais”. Ora, direito sexual é como o direito de expressão: toda pessoa tem o
direito de falar, mas não tem o direito de obrigar o outro a ouvi-la. O preso
não pode ser impedido de sonhar com uma mulher ou até de satisfazer
solitariamente sua libido. Mas isso não significa que ele tem o direito de
manter relações sexuais dentro da cadeia, mesmo que seja com sua esposa. E a
razão é simples: seu desejo sexual não pode ser posto acima da segurança da
sociedade. É óbvio que, durante a visita íntima, não há meio de controlar o
preso. Ele pode usar a visita – e sempre usa – para transmitir recados aos
comparsas fora da cadeia, daí o comando que o cárcere continua tendo sobre o
crime organizado. Praticamente todas as centrais telefônicas do PCC são
administradas por mulheres de presidiários. E mulher de preso inevitavelmente o
obedece, sob pena de ser morta.
O mesmo se dá com a alimentação do preso. Não deixar um
latrocida morrer de fome e sede na cadeia é garantir-lhe um direito humano
básico, mas permitir que ele escolha o cardápio, por meio de rebeliões, como
ocorre com muita frequência nos presídios brasileiros, não passa de um abuso
com o dinheiro de suas vítimas. Hoje, até o criminoso que queima sua vítima
viva tem direito a remissão de pena não por dias trabalhados, por horas de
estudo e, pasmem, até pela simples leitura de romances na cadeia. Ou seja, o
que os acadêmicos chamam de “direitos humanos” são, na verdade, privilégios
civis, que deveriam ser privativos do cidadão que respeita as leis e não do
bandido que fere o contrato social e, por isso, tem de ser excluído da esfera
da cidadania enquanto cumpre sua pena.
Hoje, a inversão de valores é tanta que, oficialmente, por
meio das políticas públicas do governo federal, o policial militar se tornou o
inimigo público número um, enquanto se concede ao criminoso o monopólio dos
direitos humanos. A Resolução nº 8, de 21 de dezembro de 2012, da Secretaria
dos Direitos Humanos da Presidência da República, sob o comando da ministra
Maria do Rosário, estabelece em seu artigo 1º que, quando um bandido morre em
confronto com a polícia, na descrição de sua morte nos registros oficiais não
deve mais ser usada a expressão “resistência seguida de morte” e, sim,
“homicídio decorrente de intervenção policial”.
A alegação é que os policiais utilizam o chamado “auto de
resistência” para esconder execuções. Ora, nos casos em que isso ocorre, não
vai ser mudando as palavras que o crime deixará de ser praticado. Mais do que a
nomenclatura, o que importa em qualquer crime é a investigação. E essa não
deixará de ser feita caso um auto de resistência levante suspeitas, a não ser
que as autoridades responsáveis pelo controle externo da polícia se omitam.
Prova disso é que dezenas de policiais militares são expulsos da corporação em
todo o País. Classificar esse tipo de ocorrência como “resistência seguida de
morte” é uma questão de respeito com o policial. É um absurdo que, após uma
troca de tiros com assaltantes de bancos armados de fuzil, o policial tenha de
descrever a morte de um dos bandidos como “homicídio decorrente de intervenção
policial”.
Criminoso é “reeducando”, policial é “homicida”
A sociedade honesta e trabalhadora, que não se acumplicia
com bandidos, não pode aceitar essa calúnia legalizada contra a polícia,
tachando previamente de “homicida” o policial que mata para proteger a
sociedade, cumprindo seu dever constitucional. Se numa investigação sobre um
auto de resistência ficar provado que não houve confronto, mas execução, então
que o policial seja punido. O que não se pode aceitar é que o policial seja
antecipadamente tachado de homicida mesmo quando é obrigado a matar para proteger
vidas. Na prática, é essa a mancha que o policial terá de carregar em sua
imagem, caso seja obrigado a registrar a morte de um bandido em confronto como
“homicídio”. Isso é ainda mais grave quando se compara o tratamento de
“homicida” que querem dar ao policial com o tratamento de “reeducando” que a
Justiça dá a latrocidas e estupradores nas cadeias.
Atentem para esta fórmula de inversão dos valores: policial
que mata um sequestrador é “homicida”, até que prove o contrário; já o
sequestrador que mata o refém vira “reeducando” quando é preso e condenado pela
Justiça. Como se pode notar, há uma completa inversão dos valores morais: o
policial é culpado até que prove sua inocência; já o bandido é inocente como
uma criança de escola (“reeducando”), justamente quando sua culpa foi provada e
sentenciada nos tribunais. Esses fatos mostram que os acadêmicos que criticam a
Polícia Militar não estão preocupados com a segurança da população honesta e
trabalhadora – querem é atacar a sociedade capitalista, como se não fossem
justamente os mais pobres os que mais perdem com o enfraquecimento da polícia?
Os ricos podem contratar segurança privada. E os pobres? E a classe média? O
que será deles sem a polícia?
A grande verdade é que a Polícia Militar não é necessariamente
pior do que as demais instituições humanas. Convém relembrar uma máxima do
economista Albert Hirschman não aproveitada na tese do tenente-coronel Paes de
Souza: “Sob qualquer sistema econômico, social ou político, indivíduos, firmas
e organizações, em geral estão sujeitas a falhas de eficiência, racionalidade,
legalidade, ética ou outros tipos de comportamento funcional. Não importa quão
bem estabelecidas as instituições básicas de uma sociedade; alguns agentes, ao
tentarem assumir o comportamento que deles se espera, estão fadados ao
fracasso, ainda que por razões acidentais de quaisquer tipos”.
Ou seja, todas as demais instituições indispensáveis à
Justiça, como o Judiciário, o Ministério Público, a OAB, a Polícia Federal e a
Polícia Civil, para citar as principais, estão sujeitas a gravíssimas falhas
por parte de seus membros. Um juiz que mata um inofensivo e desarmado vigilante
de supermercado, como já ocorreu no Brasil, é infinitamente mais criminoso do
que um policial desesperado, que, depois de escapar por pouco das balas de um
assaltante, resolve terminar de matá-lo ao se dar conta de que ele está ferido.
É errada essa atitude do policial? Sem dúvida. Mas é compreensível, tanto que a
maioria da população, equivocadamente, a aprova. E a única forma de inibir essa
justiça vicária feita com a própria farda é dar ao policial a certeza de que
ele pode entregar o bandido aos tribunais, que a sociedade será vingada mesmo
assim – sem visitas íntimas, sem saídas temporárias, sem indultos de Natal, sem
celulares na prisão, sem regime semiaberto, sem remissão de pena e sem as
demais regalias dadas ao criminoso.
É bom lembrar que leis mais duras serviriam inclusive para
punir os maus policiais, que também existem, mas, hoje, acabam ingressando no
crime organizado ao serem expulsos da corporação. Se os maus elementos de cada
instituição humana fossem enforcados nas tripas dos maus elementos das outras,
não sobrariam condenados nem tripas. A maldade humana está relativamente bem
distribuída em todas as instituições. Por isso, é tolice creditar os problemas
da segurança pública à Polícia Militar, como insistem em fazer os acadêmicos e
até policiais influenciados por eles. Tortura, corrupção e truculência não são
privativas da PM. E a injustiça com a PM é ainda mais grave quando se leva em
conta o contexto em que a corporação atua – a miséria moral dos mais ferozes
criminosos, que não têm o menor respeito pela vida humana. Por isso, é tolice
achar que, desmilitarizando a PM, se resolvem todos os problemas da segurança
pública. Mesmo se isso fosse verdade, seria um desatino desmilitarizar a
polícia justamente quando os bandidos andam com fuzis nas ruas e transformaram
até as cadeias em quartéis crime.
Texto publicado no Jornal Opção e reproduzido no Mídia Sem Máscara e no Blog da Veja.com e neste Blog do Velho Comandante.
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