Assistindo às
presidenciáveis no debate promovido pela Band, percebi que vivemos sob a
influência de uma ideologia escancaradamente reacionária. Seus adeptos,
encilhando-se a fórmulas superadas, se dedicam, por todos os modos, a puxar as
rédeas da humanidade e da civilização. Lembrei-me dos Fóruns Sociais Mundiais e
de seu slogan - "Um outro mundo é possível". Sim, sim, escrevi eu à
época. Um novo Big Bang, uma nova Criação, um novo Paraíso com maçãs para
todos.
Foi em nome dessa ideologia que, em abril de 2000, muitos
saíram às ruas a vociferar contra o Descobrimento. Quando o MST invade uma
propriedade rural, eles chamam de ocupação. Quando se referem ao desembarque
dos portugueses em Porto Seguro, falam em invasão. Por algum motivo obscuro
ainda não escolheram Cabral, primeiro invasor, como patrono do MST. É claro que
se os portugueses tivessem tocado direto para as Índias, nosso país seria hoje
o que são as tribos que se mantiveram sem contato com a civilização. Vale
dizer: viveríamos lascando pedra.
Essa ideologia, se pudesse, acabaria com o imenso usucapião
denominado Brasil. Os negros voltariam à África, os brancos seriam banidos para
a Europa e os índios promoveriam uma continental desapropriação do solo e das
malfeitorias aqui implantadas. Alerta: os defensores de tão escabrosa
geopolítica se aborrecerão terrivelmente se você apontar o racismo embutido em
tais conceitos.
Como não poderia deixar de ser, a ideologia em pauta é
contra a globalização. Para evitá-la, teríamos que retornar às cavernas de
origem e combater o nomadismo como um fenômeno perigoso, precursor do
famigerado neoliberalismo.
Ela é, também, contra o grande capital, o que não significa
ser favorável ao pequeno capital pois o capital é um bem que degenera enquanto
cresce... Melhor e menos suspeito seria não ter capital algum. Idêntico
raciocínio leva a rejeitar a grande empresa e a grande lavoura. Se essa
ideologia tivesse poder há mais tempo, estaríamos plantando com as mãos,
tocando tambor para chover, trocando mercadorias e desinventando o dinheiro.
Malthus teria razão e o planeta providenciaria menos 4 bilhões de almoços por
dia.
Essa ideologia é contra a democracia representativa, a
pesquisa genética, as privatizações, o mercado, a tecnologia. No fundo, deve
ser contra, até mesmo, quem agride a natureza lascando suas pedras. Cuidado,
porém. Mais alguns passos para trás e a gente vira ameba.
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* Percival Puggina (69) é arquiteto, empresário, escritor,
titular do site www.puggina.org, colunista de Zero Hora e de dezenas de jornais
e sites no país, autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da
utopia e Pombas e Gaviões, membro do grupo Pensar+.
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