Abaixo, artigo do senador Aloysio Nunes Ferreira, de São
Paulo, que representou no Senado a posição do PSDB sobre a nova legislação da
internet, aprovada às pressas no dia de ontem, por uma base de senadores
serviçais em busca de um fato positivo para Dilma Rousseff.
"Um dos três pilares do Marco Civil, a neutralidade da
rede foi garantida na Câmara dos Deputados. Todo conteúdo será tratado da mesma
maneira, e o provedor é proibido de diminuir a velocidade de um serviço em
favor de outro.
Ao Senado, caberia ampliar o debate a respeito da guarda de
dados dos usuários. Ficaria para a Casa a tarefa de amarrar as pontas que
envolvem os outros dois pilares do projeto: privacidade e segurança. Essa
discussão, porém, não aconteceu.
O PLC (projeto de lei da Câmara) nº 21/2014 foi aprovado
ontem às pressas para atender ao cronograma da presidente Dilma Rousseff com
pouquíssimas emendas acatadas: apenas aquelas que alteram a redação do texto e
não obrigam sua devolução à Câmara. Defensor da internet livre e da
neutralidade da rede, apresentei 16 emendas. Quase todas foram rejeitadas.
Concordo com o pai da web, Tim Berners-Lee, que alertou para
questões que ainda precisam ser discutidas, embora o texto represente o que a
internet deve ser --aberta, neutra e descentralizada. Havia, porém, artigos que
precisavam ser modificados em nome dessa liberdade.
Um deles é eliminar o acesso a informações pessoais por
autoridades administrativas porque dá margem à possibilidade de criação de um
"big brother" oficial. Por isso, sugeri que a competência local para
requisitá-las é do delegado de polícia e do Ministério Público.
Reforcei também a inviolabilidade: "O conteúdo das
comunicações privadas será solicitado por ordem judicial e para fins de
investigação criminal ou processual penal". O texto atual exige apenas
ordem judicial, sem discriminar em quais situações é permitido obtê-las.
Um assunto que está na ordem do dia é a superexposição, e o
Marco Civil traz exigência desnecessária: substituir conteúdo ofensivo por
motivação judicial ou fundamentação da ordem de retirada. Não se pode limitar o
poder decisório de um juiz, uma vez que a lei já permite ao ofendido incluir
pedido de retratação ou resposta. Ao especificar de antemão o que deve ser
colocado no lugar do conteúdo considerado ofensivo, o Marco Civil limita a
aplicação da lei.
Outra questão delicada é a punição a provedores de aplicação
caso não tomem providências, após ordem judicial específica, para "tornar
indisponível" conteúdo apontado como infringente. O uso da expressão
"tornar indisponível", aliado à ideia imprecisa do interesse da coletividade,
pode ser instrumento de censura, contrariando o propósito da lei. E pode
resultar em uma avalanche de ações em juizados especiais, porque o texto atrai
para esse foro simplificado a competência para processar essas causas.
A não especificação de conteúdos sujeitos a indisponibilização
pode abrir brecha contra a liberdade de imprensa sempre que uma notícia for
reputada como desfavorável.
Uma resposta importante que o Marco Civil dá é exigir apenas
uma notificação do usuário para retirada de conteúdo que viole a intimidade
pela divulgação não autorizada de imagens ou vídeos com cenas de nudez ou ato
sexual. Essa regra de exclusão, porém, não oferece tratamento igual a situações
que violem a dignidade humana, como o caso da garota cuja tortura feita por uma
colega motivada por ciúme foi filmada e postada nas redes sociais. Ou do jovem
que compartilhou o vídeo do assassinato de sua ex-namorada.
Houve tentativa de assegurar a ampla defesa e o
contraditório no caso de infrações cometidas por provedores de conexão e de
aplicação, e a multa representará 10% do faturamento bruto do grupo, e não o
faturamento sem tributos, como previsto. Da forma como está, a penalidade
abrange impostos federais, estaduais ou municipais, além de contribuições
sociais e taxas. Se implantada, a medida fere o princípio da isonomia.
A chamada Constituição da internet é boa, mas
poderia ficar melhor. Votei a favor do Marco Civil, mas fui contra esse
afogadilho. Ontem, o Senado não pôde exercer seu dever de aprimorá-lo.
Parlamentares, temos a obrigação de revisar as leis originárias na Câmara para,
posteriormente, aprimorá-las. É o que diz a Constituição brasileira."
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