SÃO PAULO (Reuters) - A notícia de que Luiz Inácio Lula da
Silva pode assumir um ministério da presidente Dilma Rousseff para garantir
foro privilegiado e se ver livre das garras do juiz Sérgio Moro é um movimento
que pode trazer muito mais prejuízo do que ganhos para o ex-presidente e ainda
mais para o atual governo.
Se a entrada de Lula no primeiro escalão pode livrá-lo
efetivamente de uma suposta pretensão de Moro vê-lo atrás das grades, sua
consumação tiraria do ex-presidente o discurso de vítima e indignação que usou
tão bem na semana passada, após ser levado pela Polícia Federal para prestar depoimento
sob condução coercitiva.
Alvo da fase da operação Lava Jato lançada na última
sexta-feira, Lula disse ter se sentido "ofendido",
"magoado", "ultrajado" e "prisioneiro". Disse que
teria prestado depoimento voluntariamente caso fosse chamado por Moro, como já
tinha feito antes.
Ao mesmo tempo que se colocou como vítima, também estimulou
a militância petista e seus apoiadores, dizendo que a partir daquele momento
estava disposto a "andar este país".
"Se tentaram matar a jararaca, não bateram na cabeça,
bateram no rabo, a jararaca tá viva como sempre esteve", disse Lula,
deixando clara a intenção de concorrer novamente à Presidência.
Depois disso, o ex-presidente teria dito a interlocutores:
"A partir de agora, se me prenderem, eu viro herói. Se me matarem, viro
mártir. E, se me deixarem solto, viro presidente de novo”.
Virar ministro a essa altura dos acontecimentos jogaria por
terra praticamente todo esse discurso. Com o cargo, qualquer investigação ou
ação judicial contra Lula teria que passar pelo Supremo Tribunal Federal (STF),
tirando de Moro a competência para o caso.
Ainda que Lula pudesse falar em arbitrariedades e
perseguição da Lava Jato, o movimento seria visto como um sinal claro de
desespero e, para seus adversários e não só eles, como uma forma de assunção de
culpa.
Se fosse para assumir um ministério, Lula deveria ter feito
isso em agosto do ano passado, quando essa possibilidade veio à tona. Na
ocasião, a justificativa oficial era de que sua entrada formal na administração
Dilma, provavelmente no Ministério das Relações Exteriores, seria uma forma de
fortalecer a coordenação política do governo.
Não se escondia mesmo naquele momento que o óbvio ganho do
foro privilegiado seria de certa forma um embaraço, mas pelo menos a Lava Jato
ainda se encontrava relativamente distante de Lula, embora muitos de seus aliados
já dissessem que o alvo real da operação era o petista.
Agora não se trata mais de simples discurso petista. A Lava
Jato está efetivamente investigando Lula e há quem diga que sua condução
coercitiva na última semana não passou de um teste para a força-tarefa de
Curitiba no caso de uma futura prisão do ex-presidente.
Para o Palácio do Planalto, o estrago não seria menor com
Lula ministro. Combalido por uma baixíssima popularidade em um cenário de
desemprego em alta, inflação elevada e enfrentando um processo de impeachment
contra Dilma, o governo passaria mais uma imagem de desrespeito com a coisa
pública ao usar a nomeação para o ministério como uma forma de fuga da Justiça.
No caso de Lula, o movimento não seria uma garantia
definitiva. Primeiro porque se Dilma sofrer o impeachment, Lula perderia o
ministério.
Mais do que isso, se afinal houver provas mesmo contra o
ex-presidente, não há por que imaginar que o Supremo deixaria de condená-lo,
ainda que num ritmo processual muito mais lento do que o de Moro.
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Alexandre Caverni é
editor de Front Page do Serviço Brasileiro da Reuters. As opiniões expressas
são do autor do texto.
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