Por Fernanda Távora e Louise Rodrigues*
Ato público na OAB discutiu prisões arbitrárias de ativistas
Evento reuniu advogados, políticos, estudantes, sindicatos e
representantes de organizações não governamentais
Presente em um ato público, na sede da Ordem dos Advogados
do Brasil (OAB), no Centro do Rio, a deputada federal Janira Rocha (Psol), pode
ser indiciada por favorecimento ao ajudar a advogada Eloísa Samy e os ativistas
David Paixão e Camila Nascimento a saírem do consulado do Uruguai na noite
desta segunda-feira (21). Segundo o corregedor da Alerj, Comte Bittencourt, foi
emitido um ofício solicitando explicações sobre as acusações que pesam contra
Janira. Ainda de acordo com Comte Bittencourt, dependendo da resposta da
deputada, serão tomadas as "decisões cabíveis" na Corregedoria.
Apesar disso, Janira afirmou que não se arrepende de ter
ajudado a retirar os ativistas do consulado. Segundo a deputada, o consulado
pediu para que os ativistas se retirassem do local ou a polícia seria chamada.
Janira levou Eloísa e os outros dois ativistas em um carro da Alerj e saiu pela
porta da frente. “O carro da Alerj não pertence ao Paulo Mello (presidente da
Alerj), pertence ao povo e deve ser usado por ele. A situação que estamos
vivendo é grave. A juventude está sendo criminalizada, mas vamos brigar até o
final”, afirmou Janira durante um ato público, que aconteceu nesta terça-feira
(22), no prédio da Ordem dos Advogados do Brasil, na Avenida Marechal Câmara.
Ato público
Marcado para esta terça-feira (22), o ato público, contra as
prisões dos 23 manifestantes, reuniu membros da instituição, de direitos
humanos, políticos, advogados, estudantes de direito, sindicatos e
representantes de organizações não governamentais. O ato aconteceu no plenário
Evandro Lins de Silva, na sede da OAB. Na mesa de debates estavam Ronaldo
Cramer, vice-presidente da OAB-RJ, Wadh Damous, ex-presidente da OAB-RJ e
membro honorário da instituição, Nadine Borges, presidente da Comissão da
Verdade no Rio de Janeiro, Sandra Carvalho, da Justiça Global, Thiago José,
diretor de comunicação da União Nacional dos Estudantes(UNE) e Marcello
Oliveira, presidente Caixa de Assistência dos Advogados do Rio de Janeiro
(CAARJ).
Durante o ato público, foram feitas críticas à dificuldade
de acesso dos advogados dos ativistas aos autos dos processos. Ronaldo Cramer
destacou, durante a abertura da mesa, a presença da OAB durantes as
manifestações e a necessidade de amparar o trabalho dos advogados na defesa de
manifestantes. "O que vimos, de dez dias para cá, nos deixou muito
preocupados. Inquéritos sem provas, prisões, intimidação, e empecilho aos
advogados para acessarem o processo. Os advogados têm que conseguir atuar na
defesa de seus clientes. Querem impor medo na advocacia, mas eles não vão
conseguir. Contem conosco".
Wadh Damous, ex-presidente da OAB-RJ, disse que existem três
itens fundamentais em um processo para julgar e condenar alguém: relatório,
fundamentação e conclusão. "Hoje nós vemos que esses três itens estão
acrescidos de pressão social e pré-condenações. Os juízes estão chancelando uma
condenação previamente declarada. Não existe intimidação aos juízes, apenas
estamos chamando a atenção para o fato de que ninguém, está acima da lei, nem juízes
e nem o MP".
Nadine Borges, presidente da Comissão da Verdade do Rio de
Janeiro, Marcello Oliveira, da CAARJ, e Thiago José, da UNE, compararam o
momento atual com governos de ditadura e enfatizaram a supressão do habeas
corpus. Eles também criticaram o acesso da imprensa aos processo dos réus
diante da recusa do governo de conceder informações aos advogados. Thiago pediu
a desmilitarização da policia, a reforma do sistema carcerário, a extinção dos
resquícios da ditadura e que fosse feito um pacto pela democracia.
Nadine também leu um manifesto que foi assinado pelos
presentes durante o ato. O manifesto é contra a violação do estado de direito,
as prisões arbitrárias e defende a luta pela defesa da democracia. O documento,
segundo Nadine, será encaminhado para o tribunal superior, o Supremo Tribunal
Federal (STF) , Ministério da Justiça, Tribunal de Justiça, para a presidente
Dilma Rousseff, autoridades internacionais, Organização das Nações Unidas
(ONU), Organização dos Estados Americanos (OEA) e para o juiz Roberto Caldas,
da Corte Interamericana de Direitos Humanos. “Não estamos aqui para julgar
ninguém, mas para exigir um julgamento justo. Eles dizem que têm evidencias
queremos ver essas evidências. Vamos denunciar a sucessiva violação de direitos”,
concluiu Oliveira.
A representante da Justiça Global, Sandra Carvalho, se
mostrou preocupada com a atual deslegitimação das lutas sociais. Segundo ela, a
justiça global está organizando um mapeamento dos casos de prisão de
manifestantes. Sandra pediu uma mobilização nacional para enfrentar esses
abusos e criar estratégias para dar visibilidade à luta pelo estado de direito.
"É preciso apresentar um contraponto a tudo que esta sendo apresentado
como justificativa para a prisão dos manifestantes", pontuou Sandra.
Logo depois, foi dada voz aos inscritos no ato. A deputada
Jandira Feghali (PCdoB) parabenizou a OAB pela iniciativa e disse que é
importante ampliar o discurso para que a sociedade compreenda o momento atual
da política carioca. Ela apontou que os deputados estão sendo apresentados na
mídia como defensores da ilegalidade e intimidadores de juízes. "Diante
disso é possível perceber que todo esse jogo não está descolado do processo
político eleitoral. Querer associar a esquerda a ilegalidade não é umas coisa
dos dias de hoje. Ilegais são eles que estão furando a democracia, com ela não
se transige. Decisão judicial se questiona sim. Se o juiz acha que está sendo
intimidado é uma prova de um viés autoritário", defendeu Jandira.
O deputado Chico Alencar (Psol) também foi convidado a
falar. Em tom crítico e demonstrando insatisfação, Chico falou que
"estamos revivendo sentimentos de quatro décadas. Resistimos contra a
ditadura e estamos resistindo de novo". O deputado também pontuou que “a
história só se repete como farsa ou como tragédia.Queremos evitar a tragédia.
Vivemos um fascismo cultural que contamina pessoas, setores e instituições.
Estamos dando marcha ré na democracia”. Ele lembrou a criminalização dos
sindicatos e das manifestações, que chamou de "absurdos" e discursou
dizendo que "vivemos tempos sombrios. Somos acusados de politização,
intimidação, e irresponsabilidade democrática. Não aceitamos que livros virem
bombas, e indícios virem provas contundentes". Chico terminou seu discurso
parafraseando Mario Quintana: “eles passarão. Nós, sem gaiolas, passarinhos”.
Em seguida, Marino Icaraí, advogado de quinze réus falou aos
presentes no ato. Ele contou que tem sido ameaçado no exercício do seu dever.
"Esse ato que está acontecendo aqui por que ele nos enche de coragem e
eleva a moral", disse Icaraí. O advogado contou que chegou a se abrigar na
OAB depois que começou a ser perseguido. “Vivemos tempos sombrios de uma
ditadura civil. Até hoje não tenho a integra dos processos. A polícia prende
para investigar e faz antecipação de juízo", contestou. O advogado contou
que manifestantes tiveram suas casas revistadas e foram levadas para a
delegacia, sem mandato, para depor como vitimas de busca e apreensão. “Nada
mais nada menos que o velho DOPS [se referindo ao Departamento de Ordem
Política e Social, um dos órgãos da ditadura militar] . Chamar esses
manifestantes para depor como vitimas é uma maldade inominável porque a
testemunha não pode evocar o direito de silêncio. Isso é ilegal”, protestou.
Logo depois, o advogado Rodrigo Mondego, que acompanhou a
ativista Eloísa ao Consulado do Uruguai, tomou a palavra. Bastante emocionado,
ele defendeu a liberdade de expressão e afirmou que o estado do Rio é o estado
que mais viola os direitos humanos. "Se manifestar é um direito
humano", reforçou Mondego. O advogado também condenou a perseguição aos
advogados e disse que diferente, de outros estados brasileiros, no Rio os
advogados não tiveram acesso ao Centro de Comando e Controle. Sobre Eloísa,
Mondego lembrou que a colega de profissão era uma das advogadas mais atuantes
nas manifestações e acolheu um menor abandonado. "Ela está sendo
perseguida. Esse é um caso simbólico da violação dos direitos dos
advogados", enfatizou. Rodrigo terminou sua fala gritando "Liberdade
para Elo".
O deputado Jean Wyllys (PSOL) foi breve em sua fala. Ele
explicou o processo do pedido no Ministério Público e classificou as prisões
preventivas e temporárias como um abuso. "A representação nasceu daí, com
o objetivo de protestar contra esse abuso e não de intimidar juízes. Não
estamos defendendo violência, estamos defendo princípios", esclareceu
Jean.
Fonte: Jornal do Brasil
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*Fernanda Távora e
Louise Rodrigues são do projeto de estágio do JB
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