Por Alberto Mansueti
Na Venezuela, Maduro e os chavistas discutem se devem
aplicá-las ou não e na Argentina, Cristina sempre teve suas dúvidas. Porém, são
políticas que desde há anos os governos de Ortega na Nicarágua, Santos na
Colômbia, Correa no Equador, Humala no Peru, Morales na Bolívia, Tabaré e
“Pepe” no Uruguai, e igualmente Lula e Dilma no Brasil, por exemplo, as
aplicam.
“Neo” liberais significa mais ou menos inspiradas no
Consenso de Washington (CdeW) dos anos 90, uma lista de “recomendações de
política”, que na ocasião os burocratas do FMI e do Banco Mundial viram como
“viáveis e sustentáveis”, quer dizer: aceitáveis pelos principais atores.
São 10, e se resumem assim: 1. Disciplina fiscal e orçamento
em equilíbrio, 2. priorizar o gasto público: em medicina básica, educação
primária, infra-estrutura, 3. impostos: baixar taxas para subir a arrecadação, 4. tipos de juros: livres, 5. taxa de câmbio: “competitiva”, 6. substituir
barreiras quantitativas às importações por taxas alfandegárias e depois
reduzi-las pouco a pouco até 10% ou 20% na média, 7. alentar todo o
investimento estrangeiro direto,
8. privatizar empresas estatais, 9. eliminar
barreiras legais à entrada e saída nos mercados e 10. reforçar direitos de
propriedade. Até aqui diz o CdeW.
As principais razões dos governos socialistas para fazer
estas políticas são quatro:
(I) A primeira é que o marxismo econômico eles já fizeram:
aplicaram-no até onde se podia, entre os anos 1930 e 1970 mais ou menos, em
quase todos os países do mundo.
Marxismo econômico é aquele “Programa Mínimo” do “Manifesto
Econômico” de 1848, redigido por Marx e Engels. Constava de dez pontos que
convém lembrar: 1. a
“reforma agrária”, 2. o imposto progressivo aos ingressos, 3. o imposto às
heranças, 4. a
estatização das grandes empresas e companhias estrangeiras, 5. o Banco Central
com seu monopólio de emissão, 6. transportes do Estado, 7. empresas de
propriedade estatal e indústrias e comércios sob o controle do governo, 8. leis
salariais e sindicais, 9. imposto aos lucros extraordinários, 10. educação
pública socializada.
Isto é comunismo, embora em “grau mínimo”, segundo Marx e
Engels. Deve-se acrescentar a medicina socializada, ponto que eles viram “muito
avançado” para um programa “mínimo”. E a questão é que já fizeram tudo isto, há
anos, e muitas destas políticas estão vigentes e são vistas como normais,
correntes, inclusive parte integral e intocável do sistema “capitalista”.
O “laissez faire” já não existe porque os socialistas o
suprimiram há muito tempo e, em troca, impuseram uma ditadura estatal à
economia, embora só até certo ponto: o ponto no qual já não podem mais
“avançar” sem cair na tragédia do parasita que mata o organismo hospedeiro. Ir
além seria exterminar 100% da produção, que quase passa nos anos 70 com o
“cepalismo” [1], e por isso retrocederam nos anos 90: privatizaram segundo o
CdeW, cedendo nos pontos 4 e 7 do Manifesto. Dois passos atrás, para depois ir
três adiante, disse Lenin.
As esquerdas enfrentam o dilema do parasita: têm de comer,
então alguém tem de produzir. Assim que ao menos “no momento”, como disse
Chávez, os socialistas pactuaram com os mercantilistas, velhos e novos,
respeitaram seus privilégios, em troca de seguir produzindo sob as condições
ditadas pelos socialistas, que comem dos altos impostos que eles e a classe
média pagam. E para isso, o CdeW serve.
(II) Segunda razão: as políticas do CdeW não são muito
liberais, são só um remédio para os piores resultados do “cepalismo” dos anos
70, ou seja, o barril sem fundo das empresas estatais e a diluviana impressão
de cédulas, cujos efeitos pretendiam “conter” com meios grosseiros: controles
de preços, de câmbios e tipos de juros. Até aí. Porém, o CdeW não é
incompatível com um “Grande Estado” educador, médico, banco-centralista e
regulamentador. Não figura a tripla redução do governo em funções, em poderes e
em gastos, como seria se de verdade a lista tivesse sido inspirada no
liberalismo clássico.
É um ticket de saída daquele velho estatismo selvagem de
Allende, Cámpora, J. J. Torres, Velazco Alvarado e Alan García I (primeiro
mandato), e de entrada a um estatismo mais “prolixo”, social-mercantilista: no
contexto do “Pacto Social” com os empresários mercantilistas, nacionais ou
estrangeiros. Por isso já nos anos 90 estas políticas foram seguidas pelos
líderes e governos surgidos dos partidos nacional-populistas e de esquerdas,
todos anti-liberais, como o PRI no México, o APRA no Peru, o MNR e o MIR na
Bolívia, o Peronismo na Argentina, etc. Porque o CdeW não tem nada de
liberalismo! Deve-se chamar “Neo” mercantilismo, ou melhor ainda: “Neo”
estatismo.
(III) A terceira razão é estratégica: adotando a esquerda
oficialista, o CdeW desde o governo tira as bandeiras da oposição que, de per
si já é muito inepta e incapacitada, mas desta maneira fica totalmente desorientada,
paralisada e muda, catatônica, sem saber o que fazer, o que pensar nem o que
decidir. Assim os presidentes do Foro de São Paulo são re-eleitos sem maior
dificuldade.
(IV) Por fim a quarta: o CdeW é 100% compatível com o
marxismo cultural, a prioridade nº 1 destas esquerdas de agora. O marxismo
cultural é essa enorme tarefa destrutiva, embora já não da economia senão do
casamento, da família (aborto, eutanásia, matrimônio homossexual, etc.), da
religião, do “meio-ambiente”, da doutrinação na escola, enfim, todo esse
“politicamente correto” do “Socialismo do Século XXI”... que é tema para outro
artigo.
Tradução: Graça Salgueiro
Fonte: Mídia Sem Máscara
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Alberto Mansueti é advogado e cientista político –
http://albertomansueti.com/.
Nota da tradutora:
[1] Cepalismo refere-se à CEPAL (Comissão Econômica para a
América Latina), fundada pela resolução 106 do Conselho Econômico e Social da
ONU de 25 de fevereiro de 1948, tendo seu nome alterado em 27 de julho de 1948
pata Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe. A CEPAL é uma das cinco comissões regionais
das Nações Unidas e sua sede é em Santiago do Chile. Foi fundada para
contribuir com o desenvolvimento econômico da América Latina, coordenar as
ações dirigidas à sua promoção e reforçar as relações econômicas dos países
entre si e com as demais nações do mundo. Posteriormente seu trabalho se
ampliou aos países do Caribe e se incorporou o objetivo de promover o
desenvolvimento social.
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