Como um punguista de antigamente depois de afanada a
carteira da vítima, Lula tenta afastar-se de Dilma Rousseff com cara de
paisagem, assoviando um sambinha enquanto caminha nem tão depressa que pareça
medo nem tão devagar que pareça provocação. A malandragem deu certo no
escândalo do mensalão. O chefão caiu fora da cena do crime e a patente de
comandante do bando acabou enfeitando os ombros do subchefe José Dirceu.
Mas não se terceiriza o pessoal e intransferível. A
segunda-dama Rose Noronha, o prefeito Fernando Haddad e a instalação de uma
usina de maracutaias nas catacumbas da Petrobras, por exemplo, são coisa de
Lula. Dilma Rousseff também. Lula logo aprenderá que um poste é inseparável de
quem o inventou — e um produto de péssima qualidade pode levar seu fabricante à
falência política. Dilma Rousseff será para Lula o que Celso Pitta foi para
Paulo Maluf.
Ambos deslumbrados com os altos índices de aprovação
reiterados pelas usinas de pesquisas, o prefeito Maluf em 1995 e o presidente
Lula em 2007 resolveram mostrar que conseguiriam transformar qualquer nulidade
em ocupante provisório do trono. Para que os escolhidos cumprissem sem
resmungos a missão de guardar o lugar até que o chefe voltasse, constatou um
post de 2010, o marajá de São Paulo e o reizinho do Brasil decidiram-se, sem
consultar ninguém, por figuras sem autonomia de voo nem luz própria.
O primeiro pinçou na Secretaria de Finanças do município um
negro economista. O segundo pinçou na Casa Civil uma mulher economista. Ao
apresentar o sucessor, o prefeito repetiu que foi Maluf quem fez São Paulo.Mas
quem arranjou o dinheiro, revelou, foi aquele gênio da raça chamado Celso
Pitta. Ao apresentar a sucessora, o presidente reterou que foi Lula o parteiro
do Brasil Maravilha. Mas quem amamentou o colosso, ressalvou, foi aquela
sumidade político-administrativa por ele promovida a Mãe do PAC.
Obediente a Maluf e monitorado pelo marqueteiro Duda
Mendonça, Pitta atravessou a campanha driblando debates e entrevistas,
declamando obviedades e louvando o criador de meia em meia hora. Como herdaria
uma cidade sem problemas, sua missão seria torná-la mais que perfeita com
espantos de matar de inveja a rainha da Inglaterra. Grávido de orgulho, o
padrinho ordenou aos eleitores que nunca mais votassem em Paulo Maluf se o
afilhado fracassasse.
Obediente a Lula e tutelada pelo marqueteiro João
Santana, Dilma percorreu o atallho para
o Planalto desconversando em debates e entrevistas, gaguejando platitudes e
bajulando o criador a cada 15 minutos. Como lhe cairia no colo um país pronto,
caberia à herdeira tocar em frente o pouco que faltava para torná-lo uma
espécie de Noruega com praia, mulher bonita e carnaval. Grávido de confiança, o
padrinho comunicou ao eleitorado que ele e ela eram a mesma coisa. Votar em
Dilma seria a mesma coisa que votar no maior dos governantes desde o Descobrimento.
São Paulo demorou três anos para entender que estava nas
mãos do pior prefeito de todos os tempos. Descoberta a tapeação, milhões de
iludidos escorraçaram Pitta do emprego e atenderam à vontade do seu inventor:
nunca mais Paulo Maluf foi eleito para qualquer cargo executivo. O Brasil
demorou quatro anos para compreender que, ao conferir um segundo mandato a
Dilma Rousseff, ratificara a mais desastrosa opção presidencial de todos os
tempos.
Pena que as multidões não tenham acordado algumas semanas
mais cedo. Mas enfim despertaram — e despertaram de vez, berram as
manifestações de rua e o sumiço do único “líder de massas” do mundo que só
discursa para plateias amestradas. Antes do fiasco de Alexandre Padilha nas
urnas de outubro, Lula caprichou na ironia presunçosa: “De poste em poste estou
iluminando o Brasil”, repetia.
O terceiro poste afundou a muitas léguas do Palácio dos
Bandeirantes. O segundo, Fernando Haddad, pedala no mundaréu de ciclovias para
fugir do naufrágio inevitável. O poste inaugural vai sendo tragada pelo mar de
corrupção e incompetência. Dilma Rousseff debate-se furiosamente milímetros
acima da superfície. Lula quer que afunde sozinha. Mas não escapará do abraço
de afogado.
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