Não há país que se preze que não tenha um eficiente sistema
de defesa de suas fronteiras. Estados que negligenciem esse dado básico das
relações internacionais ficam à mercê não apenas de seus vizinhos, mas,
sobretudo, no mundo de hoje, do terrorismo e das mais variadas formas de crime,
como os de contrabando, tráfico de armas e drogas.
Seria uma grande ingenuidade pensar que se trata de um gasto
público inútil, que seria mais bem aproveitado em outras áreas. O que se perde
em arrecadação tributária, segurança pública e defesa é algo propriamente
inestimável. Só a miopia poderia oferecer uma outra visão da realidade,
certamente distorcida.
O Exército brasileiro, em parceria com a Savis, empresa do
grupo Embraer, Defesa e Segurança, e sob a chancela da Vice-Presidência da República,
está desenvolvendo e implantando um moderno sistema integrado de monitoramento
de fronteiras (Sisfron). O seu projeto-piloto está sediado na cidade de
Dourados, Mato Grosso do Sul, sob a responsabilidade da 4ª Brigada de Cavalaria
Mecanizada. Deve, a curto prazo, se estender aos estados do Paraná e Mato
Grosso. A longo prazo, deverá cobrir todas as fronteiras do território
nacional, algo que colocará o país em importância em relação aos estados mais
desenvolvidos do planeta.
Não sem razão, o Exército considera esse projeto prioritário
no sistema de defesa nacional. Está ele voltado para a dissuasão de qualquer
inimigo potencial do país, adotando as formas que este vier a se revestir. Não
pode haver complacência no que diz respeito à soberania nacional. O mundo das
relações internacionais, do terror e do crime não é uma relação entre anjos.
Mesmo amigos que se respeitem devem contar com suas próprias forças.
Seu objetivo consiste em cobrir uma faixa de fronteira de
16.886 quilômetros, equivalente ao dobro da distância entre Paris e Pequim,
correspondendo a uma área de 2.553.000 quilômetros quadrados e englobando 588
municípios e 11 estados. O Brasil é um país continental. O projeto-piloto em
andamento corresponde, preliminarmente, a 650 quilômetros, equivalente a uma
distância Berlim-Bruxelas.
Nesta faixa de fronteira, em boa parte seca, há problemas
recorrentes de contrabando dos mais diferentes tipos, que terminam se
estendendo para todo o território nacional. O crime organizado, quando
tolerado, é como uma epidemia que se propaga sem limitações. Por sua vez, o
terror, já sabemos, desconhece fronteiras.
Somente uma solução sistêmica e integrada pode dar conta de
uma questão efetivamente estratégica para o Brasil. Mesmo nossos estados
vizinhos possuem o maior interesse em uma parceria deste tipo. Eis por que tal
projeto, sob responsabilidade e liderança do Exército, integra a Polícia
Federal, a Receita Federal, a Polícia Rodoviária Federal, as polícias
estaduais, civis e militares, o Ibama, a Embrapa, as secretarias da
Agricultura, entre outros.
Defesa vem aqui também significar um efetivo sistema de
inteligência e de coleta de dados, compartilhado por outros órgãos estatais.
Torna-se, assim, eficaz tanto no controle do gado e da febre aftosa,
contribuindo para a vigilância sanitária, quanto de veículos e embarcações,
passando por drogas, armas, cigarros, medicamentos e brinquedos. O Sisfron é,
neste sentido amplo, um instrumento poderoso de desenvolvimento
econômico-social, propiciando um salto tecnológico na defesa militar de nossas
fronteiras.
Tal projeto, do ponto de vista tecnológico-militar, inclui
sensores (radares móveis e fixos); comunicações dos mais diferentes tipos,
inclusive por satélite; veículos aéreos não tripulados (Vants); sistemas de
defesa integrados, envolvendo toda uma infraestrutura logística, integrada a
uma cadeia de comando, cujas decisões se tomam no mais alto nível. Note-se que
tal equipamento é de conteúdo nacional, em torno de 78%. Defesa nacional exige
empresas nacionais, independentes de qualquer processo decisório situado fora
do país. Se não for assim, não há soberania nacional!
O tráfico de armas se faz pelas fronteiras, que termina
alimentando as favelas brasileiras. Fuzis e pistolas militares ostentados por
traficantes e seus militantes, inclusive menores, possuem essa proveniência.
Não são comprados em lojas! As drogas que minam a nossa juventude transitam por
essas mesmas fronteiras, não sendo eficazmente combatidas.
Tais produtos acompanham o contrabando de diversos setores
como brinquedos, cigarros, medicamentos, óculos e roupas que, assim, ingressam
“livremente” no país, se é que o termo “livremente” tenha aqui a sua expressão
adequada. O crime é um sistema de vasos comunicantes! E ingressam sem
certificação, sem recolhimento de impostos, com enormes prejuízos para o país,
aumentando o nosso desemprego e contribuindo para o fechamento de indústrias e
comércios.
Para que se tenha uma melhor ideia da perda de arrecadação
de tributos nas três esferas de governo, estima-se em R$ 100 bilhões o volume
anual de contrabando. Em 2014, para dar um exemplo, somente o contrabando de
cigarros paraguaios significou uma evasão fiscal de R$ 4,5 bilhões. E quanto
maior for a tributação deste produto, em nome do politicamente correto, maior
será o aumento correspondente do contrabando!
Para que se tenha uma ideia ainda mais precisa, o Sisfron
exigirá, neste ano, para cobrir Mato Grosso do Sul, Mato Grosso e Paraná, o que
se pode bem considerar a modesta cifra de R$ 220 milhões! Imagine-se o ganho
nacional!
Uma eficaz defesa de nossas fronteiras, com a redução do
contrabando, além do aumento da arrecadação tributária, significa redução da
criminalidade, aumento de empregos, consolidação de empresas no comércio e na
indústria e aumento correspondente da segurança pública.
Somente a soberania nacional pode tornar o país respeitado
nacional e internacionalmente. Qualquer hesitação em projetos deste tipo não
apenas desacreditaria o Exército nacional e as empresas a ele associadas, como
poderia comprometer o nosso próprio futuro enquanto nação livre e soberana.
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Denis Lerrer Rosenfield é professor de Filosofia da
Universidade Federal do Rio Grande do Sul
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