Editorial O Globo – 02/06/2014
Por determinação constitucional, a remuneração de servidores
públicos de todos os níveis da administração (União, estados e municípios) do
país obedece a um teto salarial, atualmente fixado em 29,4 mil mensais.
Corresponde aos vencimentos de um ministro do Supremo Tribunal Federal, aí
incluídos não só os salários-base dos planos de carreira, mas também os
diferentes benefícios distribuídos sob qualquer rubrica (adicionais etc.). Ou
seja, nenhum funcionário público pode receber por mês salários que ultrapassem
este limite (embora, nos três Poderes, não sejam poucos os casos de desrespeito
à norma, graças a diversos artifícios).
Está aí o equívoco de princípio na decisão da Comissão de
Constituição e Justiça do Senado de aprovar o Projeto de Emenda Constitucional
63/2013, a chamada PEC da Magistratura, abrindo caminho para a tramitação do
dispositivo em plenário.
A emenda propõe a
criação de um adicional por tempo de serviço de 5%, a ser aplicado a cada cinco
anos, sobre os vencimentos dos magistrados e também no quadro dos Ministérios
Públicos federal e estaduais. É uma conta que cresce ainda mais com a previsão
de que tais benefícios serão incorporados aos salários, alcançando inclusive os
aposentados e pensionistas. Se a emenda for aprovada, o salário de fato de um
ministro do STF subirá para quase R$ 40 mil. A PEC ganhou o “nada obsta” da CCJ
do Senado sem que se saiba exatamente quanto a generosidade custará aos cofres
públicos, mas há estimativas de que, somente para a União, a fatura possa
chegar, ao ano, a R$ 450 milhões (mais do que uma Arena das Dunas, pouco menos
que um Castelão, estádios da Copa do Mundo).
Mas este é apenas o custo de partida da farra, à parte o
desrespeito à norma do teto constitucional. Por conta de dispositivos que
engordam o cipoal de regras, normas e outros instrumentos da burocracia, muitos
deles insondáveis, o funcionalismo público em geral, e não apenas o quadro da
magistratura e dos MPs, costumam ser contemplados com o direito à isonomia.
Ou seja, além de a emenda ir de encontro à Constituição (e à
busca da moralização implícita no artigo que determinou a limitação dos
salários no serviço público), é de se esperar que, no rastro de sua aprovação,
advenham generalizados reajustes em cascata, não só nos tribunais, mas em
quaisquer repartições públicas. Mais: como a PEC dos Magistrados estabelece que
os beneficiários poderão usar o tempo de serviço anterior à data de publicação
do ato, alcançando também os aposentados, pode-se prever que, à sua
incorporação à Carta, sobrevenha uma enxurrada de pedidos de indenizações
reclamando direitos retroativos.
Em si, a paternidade da PEC já não a recomendaria. A
proposta saiu do gabinete do senador sem voto Gil Argello (PTB-DF). Mas ainda
que assim não fosse, o impacto dessa generosidade nos orçamentos da máquina
pública precisa ser analisado seriamente pelos senadores. A sociedade não pode
pagar a conta dessa festa.
Fonte: A Verdade Sufocada
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