Por Guilherme Fiuza*
Dilma Rousseff falou grosso. Declarou que considera
“inadmissível” a privatização da Petrobras. Com toda a bravura do seu gesto, a
presidente, infelizmente, está atrasada. A Petrobras já foi privatizada.
A maior empresa brasileira pertence hoje, majoritariamente,
a um consórcio de franco-atiradores que prosperaram no seio do governo popular.
Se não, vejamos: uma empresa que, numa única transação, transfere a terceiros
mais de 500 milhões de dólares, a fundo perdido, de patrimônio público, é uma
empresa dos brasileiros?
Poderia ser. Mas, e se essa empresa perde metade do seu
valor de mercado sob um governo que asfixia seus preços para mascarar a
inflação? Considerando-se que, em tal manobra, essa empresa foi utilizada por
um grupo partidário para se perpetuar no poder, ela está servindo aos
brasileiros? Quais brasileiros?
E se um grupo de fornecedores e intermediários investigados
pela Polícia Federal, com contratos suspeitos com essa empresa, faturou mais de
30 bilhões de reais nos últimos dez anos? Você ainda acha que essa empresa é
sua? Tudo bem, talvez você ache que o Land Rover do Silvinho Pereira também é
seu. Aliás, agora você tem também o Land Rover do ex-diretor da empresa Paulo
Roberto Costa, presente do doleiro Alberto Youssef. Pode escolher com qual dos
dois você não levará sua mãe para passear no dia dela.
Segundo a Polícia Federal, o esquema centralizado por Costa,
que está preso, funciona desde 2004. Era o segundo ano do governo Lula, e a
nova presidente do Conselho de Administração da Petrobras era Dilma Rousseff.
Nesses dez anos, floresceram os negócios do doleiro Youssef, regendo uma
formidável orquestra de contratos superfaturados, propinas e dinheiro de graça
para políticos amigos do povo. Um deles era André Vargas, que o PT de Dilma
tirou do anonimato e aninhou na vice-presidência da Câmara dos Deputados, nada
menos. O governo popular sabe valorizar um bom engenheiro de prospecção de
dólares. O petróleo é deles.
Aí vem a oposição pedir a CPI da Petrobras. Pura inveja.
Choro de quem não participou desse bem-sucedido processo de privatização.
Muitos não entenderam por que, em meio às revelações sobre lucrativos negócios
privados com esse doce de mãe que é a Petrobras, Dilma veio falar que não
admite a privatização da empresa. Alguns acharam até que a presidente estivesse
esclerosada, respondendo a coisas que ninguém perguntou. Nada disso. Pensando
bem, a lógica de Dilma está perfeita: é inadmissível privatizar algo que já foi
privatizado.
Lula e Dilma escalaram Renan Calheiros para barrar a CPI da
Petrobras, ou, pelo menos, sabotá-la. É a pessoa certa no lugar certo. O
presidente do Senado entende dessa matéria de prospecção de vantagens privadas
à sombra do Estado (já provou que um eficiente servidor da nação não deixa
ex-namorada sem pensão). E o cenário político é o melhor possível para barrar
essa tentativa de fuxicar a petrolífera dos companheiros.
Os novos manifestantes e revolucionários urbanos, que,
segundo se lê por aí, vieram vocalizar um poderoso anseio de mudança, não estão
nem aí para a CPI da Petrobras. O governo popular está cozinhando o assunto há
dois meses, tranquilo, sem nenhum ninja, mascarado ou tranca-rua para lhe
causar nem um sorriso amarelo.
O Brasil está satisfeito com o padrão petista de concubinato
estatal (em comunhão de bens). A privatização do Banco do Brasil pelo
valerioduto, por exemplo, encheu o PT de dinheiro público e foi saudada pela
nação com a reeleição de Lula. A entrega do PAC à conexão Delta-Cachoeira foi
chancelada com aprovação recorde a Dilma em 2012.
A CPI do Cachoeira, aliás, não levou às ruas um gato pingado
com cartolina de protesto. A mulher do bicheiro virou musa, e a farra dos
superfaturamentos no Ministério dos Transportes retornou no ano seguinte, nova
em folha. A CPI da Copa, que trataria da privatização do BNDES na jogada dos
estádios bilionários, foi engavetada pelo Congresso — sem nenhuma alma penada
gritando que não vai ter Copa.
É claro que, com todas essas privatizações estatais do
governo popular, está ficando difícil fechar as contas públicas (mesmo com a
maquiagem contábil). Mas não tem problema. O ministro da criatividade
fazendária, Guido Mantega, já anunciou que pode haver um aumento de impostos
sobre bens de consumo. Perfeito. O contribuinte precisa ser chamado a completar
o caixa, porque os sócios de Youssef não podem morrer de fome.
Agindo assim, o governo Dilma está em consonância com a
coqueluche mundial dos progressistas, o best-seller “O capital no século XXI” —
obra de mais um autor da bondosa esquerda francesa. Basicamente, ele propõe
mais impostos para quem consegue juntar dinheiro. É isso aí. Preservem Youssef,
Rousseff e demais companheiros do povo. Como diria Thatcher, o socialismo será
eterno enquanto durar o dinheiro dos outros.
Fonte: Alerta Total
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*Guilherme Fiuza é Jornalista. Originalmente publicado em O
Globo.
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