Por João Baptista
Herkenhoff*
A atual Constituição
Federal estabelece que a investidura em cargo ou emprego público depende de
aprovação prévia em concurso de provas ou de provas e títulos, de acordo com a
natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei.
(Artigo 37, inciso II).
A norma imperativa do
concurso público não é um preceito acidental ou fortuito, dentro da Constituição,
mas expressa valores éticos e jurídicos que a república deve consagrar.
Se a Constituição preceitua
o concurso público, para a entrada no serviço público, refere-se obviamente a
concurso honesto. Concurso desonesto não é concurso, mas falsidade, engano,
mentira, ludibrio, zombaria…
O ingresso no serviço
público pela porta do concurso honesto é extremamente benéfico para o conjunto
da sociedade, como tentaremos provar neste artigo.
Em primeiro lugar, os
concursos sérios podem selecionar os candidatos mais bem preparados. A escolha
dos melhores pretendentes para as vagas em disputa permite que a administração
recrute pessoas competentes que vão realizar seu trabalho com discernimento e
capacidade, o que não acontece quando o critério do mérito é substituído pelo
critério do favoritismo.
Em segundo lugar, aqueles
que são aprovados em concursos honestos não ficam devendo favor a ninguém. O
preço desses favores, em muitas situações, é justamente descumprir os deveres
inerentes ao cargo, servindo a interesses particulares escusos.
A terceira vantagem do
concurso impoluto é o valor ético desta forma de recrutamento, já que traduz
idéias fundamentais de justiça como igualdade de todos, sentido de cidadania,
valor do estudo e do esforço, serviço público de qualidade como direito social.
A quarta vantagem dos
concursos limpos é a contribuição que proporcionam para o avanço educacional do
povo. Quem está convencido de que presta um concurso realizado dentro de
padrões de seriedade estudará muito para esse concurso. O ato de prestar um concurso
é sempre oportunidade de crescimento intelectual, aprimoramento espiritual,
aprendizagem. Nenhum jovem perde seu tempo fazendo concursos quando estes estão
isentos de burla.
A quinta vantagem dos
concursos sem falcatruas é a lição que tais concursos ministram aos jovens,
pois que instilam, na alma deles, a crença na retidão e desestimulam a opção
pelo caminho da fraude como forma de vencer na vida.
A sexta vantagem dos
concursos sem traficância é de natureza psicológica. Faz bem ao espírito buscar
oportunidades pela rota do bem, e não pelos tranvios das maracutaias.
Concursos sujos, com cartas
marcadas, para proteger afilhados e parentes é deslavada forma de corrupção.
Entretanto, com freqüencia, tem-se a falsa idéia de que isto é somente uma
irregularidade porque corrupção é apenas tirar dinheiro dos cofres públicos,
receber favores ou valores para trair deveres de ofício etc.
Eu diria que concursos
ardilosos, infames, com cartas passadas debaixo da mesa prejudicam muito mais a
coletividade do que eventuais investidas contra os cofres públicos. Os ataques
ao erário podem ser estimados num valor financeiro determinado, ainda que esse
valor seja às vezes muito alto. A entrada no serviço público pelos corredores
do nepotismo traz maleficios muito superiores a qualquer cifra financeira, pois
retira dos jovens, principalmente os desprotegidos, a esperança na conquista
digna do futuro, introduz em cargos, mesmo vitalícios, pessoas despreparadas
para o respectivo exercício e destroça a máquina pública.
Ainda que não tenhamos
poder para corrigir todos os desmandos que ocorrem pelo Brasil afora, tenhamos
pelo menos coragem para utilizar, com independência, a palavra, este dom que
Deus deu aos homens e recusou aos animais, e com a palavra proclamar em alto e
bom som, com todas as letras: concurso público desonesto é ato de indiscutível
corrupção, quem promove concurso público desonesto é corrupto.
A palavra, por si só, não
repõe a Ética no lugar que lhe cabe, mas é através da denúncia que se inicia o
combate. Esse combate não tem possibilidade de êxito se for travado
solitariamente. Demanda união, ações coletivas dos prejudicados com vistas a
impugnar concursos maculados com o estigma do pistolão.
Fonte: Alerta Total
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João Baptista Herkenhoff,
77 anos, é pesquisador, palestrante e escritor. Autor do livro Mulheres no
banco dos réus – o universo feminino sob o olhar de um juiz (Editora Forense,
Rio).
Homepage: www.jbherkenhoff.com.br - E-mail: jbherkenhoff@uol.com.br
CV Lattes:
http://lattes.cnpq.br/2197242784380520
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