Por Percival Puggina
Nessa encrenca
política, típica de republiqueta bananeira em que o país está enfiado, volta e
meia a frase que dá título a este artigo é pronunciada, com poses de estadista,
por membros do partido governante. Que é isso, companheiro? Prá cima de mim?
Desmentidos a respeito dessa alegada luta pela democracia são abundantes,
inclusive entre participantes da atividade clandestina que, mais tarde, se
tornaram honestos historiadores do período. Exatamente por esse motivo nenhum
está no governo. A balela da luta pela democracia requer relação inescrupulosa
com a verdade.
Aliás, os
supostos "mártires da democracia e da liberdade" comandam o Partido
dos Trabalhadores em proporções decrescentes. Muitos enriqueceram com
indenizações. Ou por meios ainda piores. Outros já morreram ou se aposentaram.
Mas - curioso fenômeno - as fraudulentas credenciais da luta pela democracia
são transmitidas, oral e magicamente, entre sucessivas gerações de comunistas
brasileiros.
Sempre que penso
sobre isso me vem à mente um episódio no qual terroristas e guerrilheiros
tiveram a oportunidade de proclamar ao Brasil quem eram e o que pretendiam. E o
fizeram, para a História, de viva voz e próprio punho. Era o mês de setembro de
1969. Duas organizações guerrilheiras, a ALN e o MR-8 haviam sequestrado o
embaixador dos Estados Unidos, Charles Burke Elbrick, e imposto condições para
libertá-lo: soltura de 15 presos políticos e leitura em cadeia nacional de
rádio e TV de um manifesto que haviam redigido. Naqueles dias, estava em plena
vigência o AI-5 e o Brasil era governado por uma junta militar, em virtude do
derrame cerebral que acometera o presidente Costa e Silva. Embarcar os presos
para o México e para Cuba era fácil, mas autorizar a publicação nos principais
jornais e a leitura em cadeia nacional da catilinária dos sequestradores era
constrangedora rendição. Contudo, a execução do embaixador pelos sequestradores
seria um mal maior. E a junta militar se rendeu.
O país parou para
ouvir o texto redigido por Franklin Martins, um dos sequestradores.
Oportunidade preciosa, dourada, única para guerrilheiros e terroristas dizerem
por que lutavam, afirmarem seus mais elevados compromissos e cobrá-los do
governo, não é mesmo? Qual o quê! O documento (leia a íntegra em "Charles
Burke Elbrick" na Wikipedia) foi uma xingação que falava do que os
revoltosos entendiam: ideologia, violência, "justiçamentos",
sequestros, assaltos. Não há menção à palavra democracia ou à palavra
liberdade.
A seca do Nordeste
ajuda mais a venda de ingressos para o desfile das Escolas de Samba no Rio de
Janeiro do que a luta armada serviu à redemocratização do país. Na prática, só
atrapalharam o processo político. Se tivessem vencido? Bem, teriam antecipado
para pior, em meio século, o estrago que estão fazendo agora.
_________________
Percival Puggina (71), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto,
empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de Zero Hora
e de dezenas de jornais e sites no país, autor de Crônicas contra o
totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do
Brasil, integrante do grupo Pensar+.
Nenhum comentário:
Postar um comentário