domingo, 26 de abril de 2015

Uma Oportunidade Perdida

Por Aileda de Mattos Oliveira

O pronunciamento terceirizado da ‘comandante em chefe’, transformada em solitário recruta ao surgir estranhamente de casaco verde-oliva, nem merece comentários.

A expectativa concentrava-se na Ordem do Dia do Comandante do Exército, alusiva à data histórica da Corporação, 19 de Abril. Solenidade antecipada, domingo era o dia, descartado, certamente, para os medalhados políticos irem para as suas bases ou para outros locais que não nos dizem respeito.

Quanto aos Generais, neles sim, reside a preocupação dos bons brasileiros que temem ocorrer, por simbiose, a perda, por esses homens, da personalidade, do compromisso com os comandados, do juramento militar, das obrigações e deveres com a soberania do Brasil, como tem acontecido, infelizmente, logo que adentram o Ministério da Defesa.

A aura petista, sabemos, é de tal maneira pestilenta que até a Ordem do Dia perdeu a grandiosidade de sua forma e de seu conteúdo para se revestir do estilo a gosto da pobreza intelectual e cerceadora dos sucessivos ministros.

Apesar disso, foi com muita propriedade que o Comandante fez atravessar no tempo os 367 anos que unem o trabalho hercúleo das forças luso-brasileiras e de seus heróis miscigenados aos miscigenados e heroicos pracinhas na Itália e, ainda, aos heroicos e miscigenados, vingativamente postos na Maré, pela presidente despeitada. Fala e imagens completaram-se. Muito bom o vídeo do Comandante.

No entanto, às vezes, no afã de falarmos com melódica sonoridade, o conteúdo da mensagem sofre a vertigem de um nocaute espetacular. Foi o que aconteceu com o conflito entre palavras que, esperamos, não tenha sido efeito adverso dos elogios, sem propósito, ao anterior Comandante, no almoço com a Reserva, em Brasília.

Parodiando a frase de César, tantas vezes repetida pela verdade contida, afirmamos que ‘não basta parecer Ordem do Dia, tem que ser Ordem do Dia’.

O Estado de São Paulo (p. A6, 17 de abril) explorou politicamente a má retórica, a ponto de dizer que “o general Eduardo Villas Bôas falou quatro vezes” a frase “uma nova Força Terrestre para o mesmo Exército”.
Nesse momento, o Comandante transformou-se num demiurgo pelo milagre realizado de uma “nova” Força Terrestre no “mesmo” Exército. “Força Terrestre” não é “Exército”?

Talvez pensasse em termos de adestramento profissional, mas não ousou falar às claras, preferindo o contraditório, o jogo labiríntico das palavras, os subentendidos. Assim, agradou a gregos e a troianos, mas não àqueles que, como eu, não pertencem a nenhum dos grupos, brasileiros e patriotas que são.

Logo veio a afirmação agradável aos ouvidos dos antigos guerrilheiros, mas insustentável para nós, que queremos um Brasil livre de mafiosos e de entreguistas, e desejamos ver as cores nacionais triunfarem sobre o vermelho da traição.

Capciosa soou a declaração de que “... o mesmo Exército sempre democrático, apartidário...” (Noticiário do Exército). A palavra “apartidário” criou uma grande dúvida em nosso espírito, e a dúvida faz mais estragos que a certeza, já que a ambiguidade é incômoda à clareza e ao sossego psicológico da parte atuante da sociedade.

Se, pela acomodação do povo brasileiro e pelo apartidarismo anunciado da Força Terrestre, houver uma tentativa atrevida de implantação do regime comunista no país, esta Força manter-se-á omissa, fechada em si mesmo? Nesse caso, estará implicitamente acatando as imposições do Foro de São Paulo, deixando, portanto, de ser “apartidária” e se ombreando ao partido do governo. Ou, ao contrário, manter-se-á fiel às suas tradições, ao lado dos defensores da democracia, que não têm partido e somente defendem o Brasil?

A oportunidade de estabelecer, firmemente, a posição do Exército ante a sociedade, que concedeu à Instituição o primeiro lugar nas pesquisas de credibilidade*, assegurando-lhe a pronta presença contra todas as ameaças internas e externas, foi perdida pelo Comandante na segunda parte de seu pronunciamento, ao não imprimir nela um demonstrativo do “braço forte“ que todos nós esperávamos. A “mão amiga” foi a retórica para petista ouvir.

Se sabemos o passado do Exército, desconhecemos o que planeja no presente, e, por essa razão, deixamos registrado ao Comandante, o nosso desapontado parecer: uma Ordem do Dia redigida sob medida, visando, unicamente, à satisfação dos interesses cerceadores dos apátridas com os quais tem que conviver, não se coaduna com a Ordem do Dia ansiosamente esperada por todo o estamento militar e pelos civis, que estão aos militares irmanados.

*Jornal Inconfidência, n.º 213, p. 13; fonte: FGV.


Fonte: Alerta Total


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Aileda de Mattos Oliveira é Dr.ª em Língua Portuguesa. Vice-Presidente da Academia Brasileira de Defesa.

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