Por Editorial - O Globo - 30/07/14
Reação violenta de Dilma, PT e Lula à análise do Santander
sobre pesquisas eleitorais lembra críticas à imprensa no mensalão e levará
bancos a praticar a autocensura
Podia-se creditar apenas ao estado de nervos no núcleo da
campanha da presidente Dilma a reação violenta dela, do seu partido e do
ex-presidente Lula à análise feita para clientes preferenciais do banco
Santander em que altas da Bovespa são relacionadas a pesquisas eleitorais
negativas para o projeto da reeleição.
Para o PT, segundo seu presidente, Rui Falcão, tratou-se de
“terrorismo eleitoral”. A própria Dilma considerou “inadmissível para qualquer
país”, disse em sabatina na “Folha de S.Paulo”, a interferência do mercado
financeiro no processo eleitoral. Já Lula, em um evento na CUT, pediu a
demissão da analista responsável pelo texto. Talvez seja o primeiro político de
origem no sindicalismo a defender publicamente a demissão de um assalariado.
Mas a explicação para reação tão violenta não é conjuntural.
O vozerio petista tem a ver com o cacoete autoritário de frações hegemônicas no
partido contra a liberdade de expressão. Mesmo de departamentos de análise de
instituições financeiras, as quais, daqui para frente, praticarão a
autocensura, como foi obrigada a fazer a imprensa durante a ditadura militar.
Talvez este seja o objetivo da resposta petista em uníssono.
A imprensa profissional conhece esta reação típica petista
diante de informações que não agradem o partido. Foi assim no escândalo do
mensalão, em cujo início o próprio presidente Lula pediu desculpas ao país.
Logo depois, ele e partido passaram a negar o malfeito e a acusar a divulgação
dos fatos como parte de um projeto “golpista”. O Santander, grupo financeiro
espanhol, sabe agora o que significa contrariar o PT. O presidente mundial do
banco, Emilio Botín, por coincidência em viagem ao Brasil, acompanha de perto a
pedagógica experiência.
Para azar do banco espanhol, no Brasil, em que o Estado tem
grande ingerência na economia, o setor financeiro é particularmente vulnerável
à ação regulatória dos governos. A mudança de uma resolução do Banco Central,
numa penada, pode produzir milhões: em lucros ou prejuízos.
Entende-se, portanto, que mesmo campanhas publicitárias de
grandes conglomerados financeiros privados reproduzam um certo ufanismo
nacionalista típico da visão que o Planalto tem do país nesses tempos
eleitorais. O que aconteceu na Copa do Mundo foi típico.
Em alguma medida, o Brasil de Dilma lembrou a Argentina de
Cristina Kirchner. Lá, quando a economia estava subordinada ao truculento
secretário de Comércio Interior, Guillermo Moreno, escritórios de consultoria
que divulgassem estimativas independentes da inflação eram punidos com pesadas
multas. Moreno e Casa Rosada queriam impedir comparações com a inflação
oficial, manipulada.
O Brasil, felizmente, devido a suas instituições, está muito
distante da Argentina kirchnerista. Mas os governos têm cacoetes muito
parecidos.
Fonte: A Verdade Sufocada
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