Por Percival Puggina
Foi o que o analista
do Banco Santander percebeu e expôs no relatório encaminhado aos clientes
preferenciais da instituição, ou seja, àqueles com maior interesse em
aplicações financeiras. Deu chabú. O presidente do partido do governo bradou
que se tratava de "terrorismo eleitoral". A presidente Dilma
proclamou ser "inadmissível o mercado interferir na política". Como é
que é? A presidente parece imaginar que o mercado seja uma pessoa com maus
sentimentos. No entanto, o leitor destas linhas sabe que entre as várias
dimensões da pessoa humana se incluem a dimensão política e a econômica. Portanto,
falar mercado e falar eleitorado é falar dos mesmos. O mercado não é formado
por um conjunto de seres abstratos, mas por pessoas que trabalham, compram,
consomem e votam.
Estranho, muito
estranho, foi perceber que a bronca do governo surtiu efeito. A direção do
banco desculpou-se, afirmou ter havido um erro, que aquela era a opinião de um
funcionário e explicitou sua convicção no sentido oposto: a economia brasileira
seguirá bem sucedida trajetória de desenvolvimento. Falar mal dizendo a verdade
não pode. Falar bem ocultando a verdade pode.
Se tudo isso lhe parece muito, aguarde que tem mais. No dia
27, à mesma entrevista coletiva em que o banco reagiu e virou pelo avesso o
relatório do seu analista (isso sim é que foi impróprio), o presidente da
Telefónica se manifestou confiante em que "o Brasil vai ter um crescimento
espetacular" e que "os governantes deste país fizeram um trabalho
espetacular" e que "os brasileiros têm que estar orgulhosos".
Espetacular, mesmo, é que ninguém, no governo ou na mídia, considerou
inadequada tal declaração, emitida por cidadão estrangeiro, presidente de uma
empresa multinacional operando no Brasil. Arre! Na terça-feira, foi a vez do
FMI, em análise do setor externo das 28 maiores economias do mundo, afirmar que
a brasileira apresenta sinais de moderada fragilidade, sendo uma das economias
emergentes mais vulneráveis a mudanças no cenário mundial. Guido Mantega não
acusou o FMI de fazer política, mas desqualificou o relatório. Sendo assim, os
erros persistirão e as consequências, permanecerão cumulativas.
Publicado em ZERO HORA - 3 de agosto de 2014.
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