Tudo aquilo de que o Brasil não precisava está em curso. Que
coisa! Sou religioso, mas não místico. Não acredito em conjunção de fatores
ditados por alguma força ou ente que nos empurrem para certo destino. Mas, às
vezes, quase cedo à tentação. Logo, felizmente, passa. O misticismo é sempre
uma forma de trapaça: ou as pessoas estão se enganando ou estão enganando os
outros. Bem depressa, sou convocado pela razão.
Marina Silva ainda não é a candidata à Presidência da
República da frente integrada pelo PSB. Mas, parece-me inescapável, será.
Percebo todos os aspectos deletérios de sua figura pública conjugados nestes
dois dias. E com que incrível saliência para o momento! Mais do que nunca,
vemos sobressair a figura da ungida, daquela que parece ter sido enviada com
uma missão que os mortais ainda ignoram, da eleita para trazer uma mensagem do
além. O terreno onde se dissolvera o corpo de Eduardo Campos ainda fumegava, e
ficamos sabendo, momento depois do acidente, que Marina deixara de embarcar no
voo por alguma razão misteriosa. Seus adoradores costumam exaltar não seus
dotes de visionária, mas as suas certezas de intuitiva. Que medo!
Hoje, sabemos ainda mais. Ela está realmente consternada — e
por que não estaria? — e teria passado a noite em claro, em vigília, embora não
em companhia da família, com quem ainda não havia conseguido falar. Por que
Marina não chegou nem mesmo a ressonar, o que certamente fizeram os familiares
de Campos, moídos pela dor e pela exaustão? Porque, supõe-se, ela mantinha um
diálogo com um ente que só se manifesta aos escolhidos. Até Caetano Veloso vem
a público expor a sua dor e nos recomendar: entreguemo-nos aos desígnios de
Marina.
O país vive um momento delicado. Hoje, só as incertezas se
adensam. Não precisamos de mais indefinições. No terreno nada místico, da
“carnadura concreta” das coisas, como diria o poeta João Cabral de Melo Neto,
somos informados de que Marina vai impor algumas condições para ser candidata.
Uma delas é ter um vice de sua confiança. Dadas as circunstâncias e as
diferenças de ideário entre ela e o PSB, o normal seria que acontecesse o
contrário. Mas o ser político cuja reputação se avoluma quanto mais repudia a
política sabe, sim, travar uma dura disputa no solo, embora pareça vinda do
céu. Ou é como ela quer, ou não é de jeito nenhum!
Vou além: considerando que Marina Silva não é do PSB e que
tem, é evidente, a chance de se eleger, o mais prudente seria que se
comprometesse a permanecer no PSB os quatro próximos anos se eleita. Afinal,
vai para uma campanha eleitoral sem que a esmagadora maioria dos eleitores
saiba que está prestes a migrar para outro partido, cujo ideário é ainda
desconhecido. Para quem diz prezar uma “nova política”, lamentando os vícios da
“velha”, seria uma atitude bastante decorosa, não é mesmo?
Desde a redemocratização, o país passa por um dos momentos
mais delicados de sua história. Infelizmente, percebo amplos setores da
sociedade, inclusive da imprensa, tocados por certo “desejo de mudança”, ainda
sem conteúdo. E isso, acreditem, por si, não é bom. O momento pede que Marina
ofereça algumas certezas, não que cobre certezas de seus pares, o que só
reforça o caráter olímpico de sua personalidade. Até porque esse distanciamento
em relação aos mortais pode ser tudo, menos compatível com a democracia.
Fiquemos atentos!
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