Por ucho.info
Olho do furacão – A um mês da Copa, a maior e mais
importante revista da Alemanha, a “Der Spiegel”, faz uma previsão sombria sobre
o Mundial no país do futebol. Com o título “Morte e jogos”, o semanário traz em
sua capa uma imagem da bola oficial do torneio em chamas caindo sobre o Rio de
Janeiro. Em três matérias, que juntas somam dez páginas, é apresentado um
retrato dos atrasos nas obras, da insatisfação dos brasileiros com os altos
custos do evento e dos prováveis embates nas ruas das cidades-sede.
“Justamente no país do futebol, a Copa do Mundo pode virar
um fiasco: protestos, greves e tiroteios em vez de festa”, afirma a matéria,
assinada pelo jornalista alemão Jens Glüsing e que leva o título de “Gol contra
do Brasil”. “As notícias serão sobre protestos e greves, problemas com
infraestrutura e violência”, prevê.
Enquanto na Alemanha os torcedores já estão vestindo a
camisa da seleção nacional, e enfeites e adereços com as cores da bandeira
estão à venda nas lojas, no país conhecido pelo carnaval, compara o jornalista,
o clima é outro: “Nas favelas do Rio, policiais e traficantes se enfrentam de
maneira sangrenta. Em São
Paulo , gangues queimam ônibus quase todas as noites.”
Para a Spiegel, o clima de festa só vai aparecer se a
seleção brasileira vencer o torneio. Mas, caso isso não aconteça, a revista
questiona se o país viverá uma onda de violência: “Os jogos vão terminar em
pancadaria nas ruas? Políticos e funcionários da Fifa serão perseguidos por uma
multidão enfurecida?”
Da promessa à ilusão
A revista traça um paralelo entre o otimismo que
tomou conta do país no início dos anos 2000, por conta dos números favoráveis
da economia, e as dificuldades vividas pelo Brasil atual para crescer. Apesar
da expansão da classe média, que cada vez consome mais e paga mais impostos, os
sistemas de saúde e educação continuam sucateados, diz a reportagem, que
prossegue: o transporte público é ruim e dois terços das residências no país
não têm saneamento básico.
A Spiegel avalia que o descontentamento da população com as
condições de vida no país agora se mistura ao ódio à FIFA: “A alegria que se
via antigamente com a Copa do Mundo transformou-se em irritação com o governo e
com a organização”. Exemplo disso, diz o texto, pôde ser observado nos
protestos que tomaram conta do país em junho do ano passado, durante a Copa das
Confederações.
“Caçando elefantes brancos”
Em outra matéria, intitulada “Caçando elefantes brancos”, a
Spiegel ressalta os valores estratosféricos gastos com a construção de novos
estádios – “cerca de 2,7 bilhões de euros (…), talvez até mais, ninguém sabe ao
certo”, alfineta a revista, destacando que o Tribunal de Contas da União, o
Ministério do Esporte e o Portal da Transparência do governo revelam valores
distintos. “Nenhum país gastou tanto com a Copa. E quase tudo foi pago com
dinheiro público.”
Enquanto isso, lembra a revista, dos 49 grandes projetos de
construção que ficariam como importantes legados do torneio, 13 sequer saíram
do papel ou foram drasticamente reduzidos. Entre eles, o trem-bala ligando o
Rio a São Paulo, ressalta o semanário alemão.
Assinada pelos jornalistas Jens Glüsing e Maik
Grossekathöfer, a matéria diz que a reforma do Maracanã é um exemplo de “como
os políticos se distanciaram do povo”, citando as palavras de um professor
americano que vive no Rio há cinco anos. A antiga casa do futebol brasileiro
“teve sua alma roubada”, destaca a publicação.
A Spiegel conta que o estádio, construído em 1950, era um
símbolo contra o racismo e a ditadura. “A arquibancada era redonda para que
todos pudessem ter a mesma visão do estádio. Não havia divisões. Quando as
equipes trocavam de lado, os torcedores davam a volta”, continua.
“E todos podiam entrar. Duzentas mil pessoas cabiam no
Maracanã, era o maior estádio do mundo. Os ingressos no anel inferior eram tão
baratos que até mesmo mendigos podiam comprá-los. Os franceses tinham a Torre
Eiffel. Os americanos, a Estátua da Liberdade. Os brasileiros, o Maracanã.”
Após diversas reformas ao longo dos anos, o estádio virou um
shopping center com grama no meio, critica a revista, e os ingressos mais
baratos custam 80 reais. “Hoje o Maracanã tem a cara de qualquer estádio da
FIFA. Podia estar em Londres, em Frankfurt ou em Yokohama”, lamenta a
reportagem. “É uma arena para a televisão, e não para os brasileiros. É um
assassinato cultural”.
Violência intrínseca
A Spiegel traz ainda uma entrevista com o escritor
brasileiro Luiz Ruffato sob o título “Sempre fomos violentos”. Nela, o escritor
ressalta os conflitos que marcaram a história do Brasil – extermínio de índios,
escravidão, ditadura – e que, para ele, marcaram a sociedade brasileira.
Ruffato causou grande polêmica no ano passado durante a
Feira do Livro em Frankfurt , quando o Brasil foi o homenageado do evento. Ele
discursou sobre as injustiças sociais e as desigualdades do país, o qual para
ele é paradoxal – ora visto como exótico e paradisíaco, ora como um local execrável
e violento. (Deutsche Welle)
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