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segunda-feira, 17 de agosto de 2015

Pela terceira vez em cinco meses, as ruas avisaram que todo o poder emana do povo


Pela terceira vez em cinco meses, o Brasil mostrou nas ruas que está farto de corrupção, incompetência e vigarice. Uma mobilização nacional de tal porte e tamanha intensidade, decididamente, não é pouca coisa. Mas o 16 de Agosto foi muito mais que isso. A unificação das palavras de ordem, por exemplo, consumou o sumiço dos nostálgicos de intervenções militares, tragados pelo oceano verde e amarelo formado por democratas que rechaçam todas as tribos autoritárias. O coro da multidão identificou com exemplar objetividade os tumores a remover antes que o estado de direito seja abatido pela infecção letal.

Em todas as regiões, a multidão exigiu o imediato despejo da presidente que já não governa e bombardeou Lula com acusações alicerçadas em fatos (além dos adjetivos, todos contundentes e todos merecidíssimos, há tanto tempo aprisionados na garganta). Aécio Neves, José Serra  e outros líderes oposicionistas enfim se juntaram aos atos de protesto e afinaram o discurso com o grito dos indignados. Inscrições em faixas e cartazes saudaram o juiz Sérgio Moro e os avanços da Operação Lava Jato. Prudentemente, Dilma trancou-se no Palácio da Alvorada com um punhado de ministros.

Deveria ter trancado no banheiro o companheiro que preside a CUT. À solta, o delinquente Vágner Freitas materializou mais uma irretocável ideia de jerico: promover uma boca-livre a favor do governo nas cercanias do Instituto Lula. Enquanto pelegos miavam no microfone, os gatos-pingados pagos para aplaudir os ataques à burguesia golpista disputavam bravamente pedaços de churrasco e garrafas de cerveja. O contraste entre a bebedeira no esconderijo do chefão e a portentosa passeata na Paulista valeu por 20 recordes de impopularidade estabelecidos por Dilma.


Neste domingo, o Brasil que presta deixou claro que continua em vigor o parágrafo único do artigo 1° da Constituição: todo o poder emana do povo e em seu nome deve ser exercido. Se tiverem juízo, os figurões dos três Poderes farão a vontade de quem manda.

Balanço dos acontecimentos de 16/08




As grandes manifestações ocorridas em todo o Brasil mostram a vitalidade da nação brasileira, que poderá tomar nas mãos seus destinos novamente.

Manifestação de adversários do PT é pelo menos mil vezes maior… Ou: Petista, se beber, não dê entrevista!


Algumas centenas de pessoas se reuniram no Instituto Lula para manifestar apoio ao PT, ao governo Dilma e protestar contra um suposto “atentado” que teria ocorrido no local. O ato foi organizado pela CUT e pelo Sindicato dos Metalúrgicos do ABC. Vagner Freitas, presidente da Central, estava lá. É aquele senhor que convocou a luta armada dentro do Palácio do Planalto, na presença da presidente da República, que se calou a respeito. Até agora, o Ministério Público não fez nada.

Neste domingo, ele voltou a falar do assunto, repetindo a cascata que publicou no Twitter poucas horas depois. Afirmou que a “arma na mão” a que se referia era uma figura de linguagem e se disse, ora vejam, perseguido nas redes sociais. Eis o presidente da CUT: conclama à luta armada e depois se diz vítima de violência virtual.

Supostos petistas intelectuais promoveram um debate num palco montando em frente ao instituto. Passaram por lá a petista psicanalista (atentem para a ordem das palavras) Maria Rita Kehl, o petista professor de direito penal Salomão Shecaira e o petista cartunista Laerte Coutinho — nesse caso, não sei em qual das personalidades: se a de homem, se a de mulher. Ela fala bobagem nas duas.

Shecaira, o petista professor, desceu o sarrafo no juiz Sergio Moro e disse que “ninguém tem a coragem de enfrentá-lo porque este tem o apoio da mídia”. Ora, por que ele próprio não aponta, então, no terreno acadêmico, as transgressões eventualmente cometidas pelo juiz, em vez de participar de um ato que se confunde com a própria defesa de ações criminosas, o que certamente não pega bem a um professor de direito?

Os petistas dizem ter reunido 5 mil pessoas. Conversa mole. A PM fala em 600. Então ficamos assim: são os 600 do PT pedindo o “Fica-Dilma” contra os 600 mil — para ficar com um número modesto — que querem a presidente fora do Palácio do Planalto.

Políticos petistas que passaram pelo local, vivendo numa realidade paralela, decidiram menosprezar o protesto que, segundo estimativa das PMs, reuniu pelo menos 794 mil pessoas.

Para o deputado estadual José Américo, secretário de Comunicação do PT, as “manifestações arrefeceram; foram números modestos”. O deputado federal Paulo Teixeira (SP) também não viu grande coisa e, acreditem!, criticou a presença de políticos tucanos nas manifestações.

Ou por outra: o PT resolveu marcar um ato de apoio ao governo no mesmo dia em que o país parou para pedir “Fora Dilma”, a manifestação do adversário é pelo menos mil vezes maior — sem hipérbole —, mas os petistas acusam o insucesso do outro.

Contam-me que havia lá barraquinhas vendendo cerveja, cachaça, uísque…

Uma recomendação aos petistas: “Antes de uma declaração, que tal passar pelo bafômetro?”. Ou então: “Se beber, não dê entrevista”.


Manifestações 16 Ago 2015 - #VemPraRua



Marco Antonio Villa no caminhão do Movimento #VemPraRua

Velório em câmera lenta

Por J. R. Guzzo
 
José Dirceu fecha enfim o seu ciclo na paisagem pública brasileira. Acaba onde começou: numa prisão. Em outubro de 1968, aos 22 anos de idade, entrou em cena ao ser preso num congresso clandestino de estudantes no interior de São Paulo. Na semana passada, apanhado nessa prodigiosa chacina que a corrupção criou dentro e em torno da Petrobras, estava de volta à cadeia, desta vez num xadrez da Polícia Federal de Curitiba, para o ato final de sua jornada. Há uma gelada melancolia nisso tudo. Entre um momento e outro, Dirceu investiu 47 anos na luta sem descanso pelo poder. Chegou lá, depois de esforços maiores do que prometia a força humana, em 2003, quando o Partido dos Trabalhadores emergiu como a principal força política do Brasil ─ mas ao chegar conseguiu ficar apenas dois curtíssimos anos, lançado ao mar pelos companheiros nas primeiras trovoadas do que viria a ser o mensalão.


Quando começou a subida, José Dirceu era visto como um herói pela esquerda brasileira; sequestraram um embaixador dos Estados Unidos, nada menos que isso, para resgatá-lo da prisão do governo militar onde estava em setembro de 1969 e permitir assim sua ida para o exílio em Cuba. Agora, ao ser preso na Operação Lava-Jato, querem mais é que ele fique lá mesmo na cadeia. Ao entrar no prédio da Polícia Federal em Curitiba, tudo a que teve direito foi uma vaia de algumas dezenas de manifestantes. Não apareceu um único amigo, militante ou movimento social para lhe dar apoio; no dia de sua prisão o “exército do MST”, que ainda outro dia o ex-presidente Lula ameaçava botar na rua para defender “o projeto do PT”, estava empenhado em gritar “fora Levy” numa baderna no Ministério da Fazenda, em Brasília. É o que temos.

É uma dessas ciladas da vida o fato de que os problemas mais sérios de Dirceu com o sistema carcerário brasileiro não aconteceram durante o período sem lei em que a justiça era feita dentro dos quartéis; são de hoje, em pleno vigor das liberdades, do direito de defesa e do reinado do PT. Dirceu ficou preso pouco menos de onze meses no governo militar que tanto combateu. Agora, no governo em que tanto mandou, já está cumprindo pena há mais de vinte, desde 15 de novembro de 2013; ficou preso até 4 de novembro de 2014 em Brasília, na Penitenciária da Papuda e em regime semiaberto, depois em sua casa, e no momento está de volta à prisão fechada.

Há comparações ainda mais tristes. No passado Dirceu esteve preso por ser “um combatente da resistência contra a ditadura”. Hoje está na cadeia por conta da “Operação Pixuleco”, cortesia do companheiro João Vaccari Neto ─ é a isso que foi reduzido. Até pouco antes de ir para a Papuda, recebia em seu escritório o ex-presidente da Petrobras Sergio Gabrielli e era um dos colaboradores favoritos entre os magnatas da empreitagem de obras públicas. Quando ele foi despachado para a PF de Curitiba, os peixes gordos tinham sumido por completo do seu pesqueiro. “Libertar Dirceu” de sua primeira prisão foi um ponto de honra para toda uma geração da esquerda nacional.

Na semana passada não era nada: não deu para levantar o braço esquerdo chamando os companheiros “à luta”, como fizera menos de dois anos atrás, porque não havia em volta nenhum companheiro disposto a lutar por ele nem a gritar “guerreiro do povo brasileiro”. Mais que tudo, talvez, Dirceu viu os chefes petistas, que o bajularam durante anos, renunciarem às regras mais elementares da decência comum neste seu momento de infortúnio. Lula ficou absolutamente mudo. O Palácio do Planalto não disse sequer uma palavra ─ numa reunião feita ali no dia da prisão, segundo o ministro da Defesa, o assunto “não foi tratado”. Com Dirceu já preso, o PT conseguiu escrever duas declarações oficiais inteirinhas sem citar uma única vez o seu nome.

O fim da linha para José Dirceu chega num momento de terremoto político em formação acelerada. Dilma Rousseff já não governa ─ deixou o poder por abandono de cargo, já há bom tempo, por capitular diante da corrupção descontrolada que destruiu seu governo e por sua inépcia terminal para a função de governar qualquer coisa. Lula não é mais que uma sombra assustada, que há muito se preocupa apenas com a própria sobrevivência. O PT, enfim, solta notas com atividade cerebral próxima ao zero, nas quais transforma em bomba terrorista um buscapé de São João jogado contra o Instituto Lula, fala em “avanço da direita” e não consegue mostrar nenhuma ideia coerente em sua defesa. Junto com a despedida de Dirceu, é o velório em câmera lenta de um partido e de um governo que optaram pelo suicídio.