Por Fausto Macedo
Manoel Fiel Filho, metalúrgico, foi assassinado nas
dependências do antigo DOI-CODI do II Exército em janeiro de 1976; juiz federal
reconheceu a extinção da punibilidade por causa da Lei da Anistia
A Justiça Federal rejeitou denúncia do Ministério Público
Federal contra sete agentes da repressão militar acusados pelo assassinato do
metalúrgico Manoel Fiel Filho, em janeiro de 1976, nas dependências do
DOI-CODI, núcleo da ditadura montado nas dependências do antigo II Exército, em
São Paulo. Os agentes também eram acusados de ocultação de informações sobre o
crime cometido no governo do general Ernesto Geisel.
VEJA A DECISÃO DA JUSTIÇA
A decisão é do juiz federal Alessandro Diaferia, da 1.ª Vara
Federal Criminal em São Paulo. O juiz reconheceu a extinção da punibilidade do
crime em decorrência da Lei da Anistia. As informações foram divulgadas pelo
Núcleo de Comunicação Social da Justiça Federal de 1.º grau de São Paulo.
(Processo n.º: 0007502-27.2015.403.6181).
A decisão aplicou o entendimento do Supremo Tribunal Federal
que julgou a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental – ADPF n. 153,
e reputou que os efeitos da anistia concedida pela Lei 6.683/79 não foram
afastados pela Constituição Federal de 1988, alcançando, portanto, os crimes
políticos ou conexos com estes.
A Lei 6.683/79 estabelece que os crimes políticos ou
relacionados a estes, praticados tanto por civis quanto por militares, entre 2
de setembro de 1961 a 15 de agosto de 1979 foram anistiados.
“Como é sabido e consabido, a decisão proferida pelo Colendo
Supremo Tribunal Federal em Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental
possui eficácia contra todos e efeito vinculante relativamente aos demais
órgãos do Poder Público, no que evidentemente se enquadram o Poder Judiciário,
o Ministério Público e os demais atores do sistema de distribuição de Justiça
vigente no Brasil”, afirmou o juiz.
O assassinato de Manoel Fiel Filho é um dos capítulos mais
emblemáticos do regime de exceção (1964/1985). Ele foi morto nas dependências
do Destacamento de Operações e Informações- – Centro de Operações de Defesa
Interna (DOI-CODI) do antigo II Exército, menos de três meses depois do
assassinato do jornalista Vladimir Herzog, ocorrido em outubro de 1975 no mesmo
reduto da repressão.
De acordo com o Ministério Público Federal, Manoel Fiel
Filho foi morto ‘por motivo torpe, na sede do Destacamento de Operações de
Informações do II Exército (DOI), com emprego de tortura, consistente na
inflição intencional de sofrimentos físicos e mentais agudos e por meio de
recurso que impossibilitou a defesa da vítima’.
Segundo a denúncia, após o crime, declarações falsas teriam
sido inseridas em documentos públicos a fim de assegurar a ocultação e a
impunidade do crime. Segundo a Procuradoria da República, as condutas que
resultaram na morte do metalúrgico não podem ser anistiadas nem declaradas
prescritas, pois teriam sido cometidas em contexto de ataque sistemático e
generalizado à população civil, qualificando-se como crime contra a humanidade.
A Procuradoria alega reiterada jurisprudência da Corte
Interamericana de Direitos Humanos em casos similares do mesmo período que
exclui a validade de interpretações que assegurem a impunidade de tais
violações.
Esses argumentos não foram acolhidos para afastar a extinção
de punibilidade. “Não se pode dizer que a repressão a opositores do regime de
exceção, por mais dura que tenha sido, tenha se estendido à grande massa da
população brasileira. O argumento peca pelo caráter hiperbólico.”
Quanto às questões de imprescrição e não aplicação de
anistia, por influência do Direito Internacional na ordem jurídica interna,
tendo como argumento que se trata de crime de lesa-humanidade, a decisão
afirmou que descabe cogitar a aplicação retroativa das disposições e diretivas
de direito internacional que pretendam invalidar, direta ou indiretamente, a
aplicação da anistia, sob pena de conflito com a decisão do Supremo Tribunal
Federal na ADPF 153 e com princípios e regras de direito que prestigiam a
segurança jurídica, como, por exemplo, a irretroatividade da lei penal mais
gravosa e outros.
“É certo, pois, que o direito, internacional ou interno,
deve sempre operar em prol da segurança jurídica, que confere estabilidade e
clareza de regras às relações jurídicas, sociais e internacionais”, aponta o
juiz Alessandro Diaferia.
A Convenção Americana sobre Direitos Humanos, ‘Pacto de San
José da Costa Rica’, alegada pelo MPF, foi assinada em 1969, entrou em vigor no
ano de 1978, e a adesão pelo Brasil somente se deu em 1992, anos após o fato
descrito na denúncia.
Para o juiz, tais normas devem prevalecer caso venha a ser
instaurado no país um novo regime de exceção, civil ou militar. “Não se nega a
relevância das disposições e diretivas do direito internacional, invocadas pelo
órgão ministerial; de fato a partir de sua inserção no sistema jurídico
interno, devem ser obedecidas, mas direcionadas às situações que ocorreram após
esse marco; ou seja: destina-se a salvaguardar o futuro com base naquilo que se
verificou no passado e que se quer evitar”, afirma a decisão.
Fonte: A Verdade Sufocada
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