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segunda-feira, 25 de agosto de 2014

RECONSTITUINDO A HISTÓRIA DO BRASIL - A Guerra contra o Paraguai

Por Jarbas Passarinho
Especial para “O INCONFIDÊNCIA”

Os livros didáticos de História do Brasil adotados nas escolas públicas brasileiras se revelam odientos e mentirosos acusando o Brasil de haver se apossado de parte do território paraguaio. Indício claro de que o ressentimento dos derrotados por 3 vezes recua, na História, à guerra contra o Paraguai, de 1865 a 1870. Seus editores e autores são energúmenos como historiadores e ignorantes como brasileiros, pois melhor deveriam conhecer os fatos históricos, mesmo os sonegados pela cátedra revanchista, marxista e incompetente.

Quando o ditador Solano Lopez iniciou as hostilidades, os aliados concertaram o Tratado da Tríplice Aliança (Argentina, Brasil e Uruguai) que se propunha a “respeitar a independência, a soberania e a integridade territorial do Paraguai”. O Brasil tinha, de fato, velha pendência territorial com a República paraguaia, herdada dos tempos coloniais, proveniente do Tratado de Madri de 1750 e do de Santo Ildefonso, de 1777. Com a independência de nossos países, não se logrou logo a eliminação da discordância quanto à linha da fronteira. No tratado de Madri, Portugal se arrimou no princípio do uti possidetis, o direito de propriedade do Paraguai à faixa de terra entre o rio Igureí e o Salto das Sete Quedas, no Tratado Preliminar de Paz, de 1872, desde que a Argentina igualmente abandonasse o direito à posse de todo o Chaco araguaio, que o Tratado da Tríplice Aliança lhe atribuía.

Como a Argentina não concordasse, o Brasil negociou em separado com o Paraguai. E mais: empenhou-se em defender os interesses do vencido, junto ao presidente norte-americano Hayes, árbitro da disputa do Paraguai com a Argentina, do que decorreu a manutenção do Chaco como território paraguaio. É verdade que, em 1872, ao ceder a linha do rio Igureí ao Paraguai, no traçado da fronteira, assegurávamos a divisa pelo rio Apa, encerrando uma divergência centenária, o que acabou definitivamente ao construirmos a usina hidrelétrica de Itaipu, com a submersão total das Sete Quedas.

Fui testemunha de uma cerimônia comovente, no transcorrer do governo João Figueiredo. Em 1980 acompanhei-o em viagem a Assunção. O presidente brasileiro levava ao presidente Ströessner a espada do marechal Solano Lopez, retirado do acervo do Museu Histórico brasileiro. Nem mesmo foi feita uma réplica, para manter em seu lugar no museu, lembrando a vitória na guerra. Os generais paraguaios, ao verem a espada, abraçaram-se lacrimejantes. O gesto de amizade parecia varrer resíduos de animosidade ainda persistentes. Não devolvemos terras porque não a usurpamos. O Brasil nunca fez guerras de conquistas. Nossas fronteiras decorrem de laudos arbitrais internacionais, respeitados mesmo quando prejudicados fomos pelo rei da Itália, árbitro da pendência com a Inglaterra, nos limites com a então Guiana Inglesa. Ele deu aos ingleses a depressão do Pirara, mais que os britânicos pediam... O Acre, o adquirimos da Bolívia, não sem antes o presidente Campos Sales haver garantido a soberania boliviana sobre as terras virgens, que foram povoadas por seringueiros nordestinos vítimas das secas, sublevados por Plácido de Castro. Isso, certamente, os autores dos livros didáticos adotados pelo MEC e pela Secretaria de Educação de Minas Gerais desconhecem. Deformam a História Pátria e têm servido para professores, em suas aulas nos estabelecimentos de ensino médio, inocularem na mente dos nossos adolescentes que a guerra contra o Paraguai foi um crime que fizemos para servir ao imperialismo inglês. Dizem, ainda, a serviço de uma ideologia fácil de identificar, que praticamos um deliberado genocídio do povo paraguaio. Revoltante embora, esses supostos mestres vão fazendo prosélitos nos jovens. A falsificação histórica tripudia sobre os cadáveres de milhares de brasileiros, nos cinco anos de luta. Desde o sacrifício de Antônio João, ao imolar-se em Dourados, até o epílogo nas cordilheiras paraguaias.

Preferindo à desonra de render-se às tropas inimigas enormemente superioras, o simples guia Antônio João morreu no combate desigual, não sem antes deixar escrita a mensagem que escrevera para a retaguarda:

Sei que morro, mas o meu sangue e o dos meus camaradas servirão de protesto solene contra a invasão do solo de minha pátria. Para os nossos imberbes estudantes, Antônio João era um desprezível peão no tabuleiro imperialista, Mato Grosso nunca foi invadido, Alfredo D’Escragnolle Taunay inventou a narrativa da Retirada da Laguna e o Rio Grande do Sul nunca foi atacado e parcialmente ocupado, nas ações ofensivas que nos tomaram de surpresa.

Enquanto Solano Lopez, ao nos impor a guerra, pôde mobilizar, desde logo, setenta mil combatentes, D. Pedro II tinha apenas pouco mais de quinze mil, dispersos no nosso território. O ditador paraguaio, sentindo-se forte, invadiu a Argentina, que lhe negou permissão para atravessá-la com as tropas que visavam chegar a Uruguaiana, e declarou-lhe guerra e ao Uruguai. Só isso basta para caracterizar o agressor.
Na guerra, a vitória exige a conquista de dois objetivos: o político, a ocupação da capital do inimigo, e o militar, a derrota total da capacidade de luta das suas tropas. Conquistada Assunção, o Marquês de Caxias regressou à capital do Império em 19.01.1869 e recebeu o título de Duque em 23 de março do mesmo ano. Sem a menor possibilidade de resistir, o marechal Lopez levou suas últimas reservas, mínimas aliás, a Cerro Corá. Repeliu a derradeira intimação da vanguarda brasileira, já ferido mortalmente:

Não me rendo. Morro por minha pátria. É cultuado como um herói. Mas é de convir que foi ele o grande responsável pela dizimação de seu povo, na medida em que jamais aceitou negociar a paz e, uma vez destroçadas as tropas regulares, recompletou-as recrutando adolescentes e crianças. Só com a sua morte em 01.03.1870, a guerra acabaria. Sua bravura, sem pensar no sacrifício imposto ao seu próprio povo, só aos paraguaios diz respeito. A nós, cabe respeitar nossos mortos honrando seus feitos e não omiti-los ou desmerecê-los como fazem certos autores e professores brasileiros que deturpam a verdadeira História do Brasil.

(Publicado no Inconfidência nº 43 de 30/11/2001)


Fonte: Jornal Inconfidência nº 205, Pg. 5


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Jarbas Passarinho é Coronel Reformado, e presidente da Fundação Milton Campos. Foi ministro de Estado, governador e senador pelo Pará.

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