Por Alberto Dines – Gazeta do Povo
Espantado com o acúmulo de brutalidades? Quer entender o que
está se passando na terra da cordialidade na véspera de converter-se em palco
de uma festa global? Então separe, tente diferenciar os tipos de agressão e de
agressores. A carga de violência continuará igual, porém a descompactação do
fenômeno facilitará a compreensão das partes e do todo.
O que está sendo designado como “manifestação popular” é
geralmente uma ação política oportunista, claramente orquestrada para obter
ganhos imediatos de autoridades perplexas e atônitas num momento de grande
tensão e nervosismo. Chantagem pura. Neste conjunto situam-se as greves
inesperadas, intempestivas, fora do calendário, fruto de cisões e disputas
entre lideranças sindicais e seus padrinhos políticos.
Foi o caso da greve de ônibus que paralisou o Rio de Janeiro
na última quinta-feira. A incrível depredação de 467 ônibus tem a ver com a
Operação Anti-UPP em curso, tática de exploração emocional de cada incidente
adotada pela grande delinquência – o crime organizado – com o propósito de
desmoralizar a política de pacificação das favelas e debilitar a capacidade de
reação do sistema de segurança.
Os fins nunca justificam os meios: as reivindicações de
trabalhadores não podem sequestrar os direitos da sociedade nem levar a extremos
que impliquem destruição das ferramentas de trabalho. É suicídio. A propagação
da violência só pode partir daqueles que dela necessitam para ocupar espaços e
manter o poder.
Algo diferente são as combinações extremas de insanidade com
crueldade, representadas por dois impressionantes assassinatos ocorridos com um
dia de diferença, portanto não isolados: no Recife, no Estádio do Arruda,
depois de um jogo do Paraná com o Santa Cruz um torcedor jogou dois vasos
sanitários contra um arqui-inimigo do Sport que comemorava o empate no meio da
torcida paranaense. Uma das latrinas (15 quilos convertidos pela altura de 24
metros em 300) acertou e matou instantaneamente o adepto do Sport.
Não é a primeira vez em que o Esporte-Rei converte-se em
cenário de tragédia. Poderá ser a última quando o circo futebolístico perder a
sua condição de fomentador de surtos de antropofagia e canibalismo.
Na etapa seguinte do torneio de brutalidades está o
linchamento da dona de casa Fabiane Maria de Jesus, 33 anos, mãe de dois
filhos, moradora no balneário do Guarujá, litoral de São Paulo confundida com
uma sequestradora de crianças a serviço de uma seita que as imolava para
rituais religiosos.
Linchadores formam-se espontaneamente, agregam-se quando o
Estado parece débil, quando leis, juízes e tribunais estão desacreditados e
onde campeia a impunidade. São ancestrais na Europa os registros de supostos
assassinatos rituais, também os castigos através de linchamentos, fogueiras e
lapidações. Ocorriam onde a religiosidade era rústica, primária, e tênue o
processo civilizatório.
Aquela remediada comunidade no Guarujá é servida pela
internet: os covardes linchadores e os insensíveis espectadores fotografaram e
postaram cenas do crime. A ira contagiosa, viral, a afunda na Idade Média.
Fonte: A Verdade Sufocada
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