Por Luiz Fernando Janot*
Mais de 200 mil pessoas lotaram o Maracanã naquela fatídica
tarde de 16 de julho de 1950, quando o Brasil perdeu a Copa do Mundo para o
Uruguai. Ao final do jogo, a multidão silenciosa não conseguia acreditar no que
estava vendo. Nascia, nessa época, o “complexo de vira-lata”, imortalizado pelo
dramaturgo Nelson Rodrigues para traduzir a inferioridade que o brasileiro
sentia em relação ao resto do mundo.
Com a autoestima em frangalhos, o jeito era esperar a
próxima Copa para recuperar o prestígio abalado. Todavia, mais uma vez, o
destino não nos foi favorável. Em 1954, a nossa equipe teve que voltar mais
cedo para casa após ser eliminada pela seleção húngara, a nova sensação do
momento. Com isso, a fama de jogarmos o melhor futebol do mundo só veio a se confirmar
com a vitória de 1958, o bicampeonato em 1962 e o tri em 1970.
Após essas conquistas, cada Copa era esperada com a
expectativa de um novo sucesso. Os preparativos para as comemorações se
espalhavam por todas as cidades brasileiras. O congraçamento popular em torno
dos grandes telões, onde os jogos eram exibidos, constituía um espetáculo
indescritível e emocionante. Esse espírito de alegria e confraternização
prevaleceu no Brasil até a última Copa, em 2010.
De lá pra cá, muita coisa mudou. Passada a euforia pela
conquista do direito de sediar a Copa de 2014, o que vimos foi um estado geral
de perplexidade diante da ganância desavergonhada da Fifa e do apoio servil das
nossas autoridades. Prometeram mundos e fundos, mas muito pouco foi feito em
benefício das cidades. Pelo contrário, o que se viu foi uma absoluta falta de
planejamento e de transparência nos projetos realizados. Forjaram obras
perdulárias, orçamentos inconsistentes, custos elevadíssimos e uma prática
recorrente de reajustes para justificar eventuais atrasos.
Transformaram os nossos estádios em reluzentes arenas
polivalentes para receber os mais variados tipos de espetáculo. Só não contaram
que, além dos financiamentos a juros subsidiados, esse modelo de estádio iria
exigir, no futuro, um aumento significativo no valor dos ingressos para
viabilizar financeiramente as “Parcerias Público-Privadas”. Com ingressos a
preços exorbitantes para os padrões nacionais, os estádios permanecem vazios
mesmo em jogos importantes dos campeonatos regionais.
Diante da falta de público, a propalada eficiência
administrativa dos consórcios administradores passou a exigir, por economia,
que alguns setores dos estádios permanecessem fechados durante os jogos,
fazendo com que as torcidas ficassem confinadas nas cadeiras atrás dos gols,
onde os ingressos são mais baratos. Cinicamente, acabaram com a alegria de a
população brasileira lotar os estádios, ao praticarem uma forma de gestão
incompatível com a nossa realidade econômica, social e cultural.
Esse padrão “Copa do Mundo S/A”, que dá à Fifa o direito de
faturar sobre tudo que é relacionado ao evento, inclusive, proibindo a
comercialização de produtos de empresas concorrentes das patrocinadoras da Copa
nas cercanias dos estádios, é mais um fator para inibir qualquer iniciativa
popular espontânea.
Ao contrário do que costumava acontecer em outras Copas, o
que vemos hoje é a triste apatia da população brasileira diante de um evento em
que ela foi colocada de lado. Até a tradicional decoração das ruas não passa,
até o momento, de alguns raros enfeites com pouca expressividade.
Apesar de tudo, não me resta alternativa senão vestir a
camisa amarela e torcer apaixonadamente pela conquista do hexacampeonato.
Passada a Copa, com vitória ou com derrota, a gente volta a enfrentar com
determinação esse jogo perverso praticado contra os interesses da nossa
população.
Fonte: Alerta Total
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*Luiz Fernando Janot é Arquiteto e Urbanista.
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