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sexta-feira, 14 de agosto de 2015

Também eleito pelo voto popular, Collor não escapou da queda exigida pela turma que agora chama de ‘golpe’ o despejo de Dilma


Como Fernando Collor em 1989, Dilma Rousseff atravessou a campanha presidencial de 2014 contando mentiras, falsificando estatísticas e declamando promessas que revogou na primeira semana de mandato. Como Collor, Dilma precisou de poucos dias para cair em desgraça com os eleitores, agravar o raquitismo da base governista no Congresso e transformar-se numa colecionadora de recordes de impopularidade. Como Collor, Dilma enredou-se em delinquências que dão cadeia em qualquer país menos primitivo.

Muito mais que Collor, Dilma fez que não viu, protegeu ou acobertou casos de polícia e esquemas corruptos cujas dimensões siderais fazem o agora senador parecer um mero batedor de carteira. Repelida, como Collor, pela imensa maioria dos brasileiros, Dilma tenta manter-se no emprego agarrada à falácia que recita na discurseira de todos os dias: nada justifica o encurtamento de um mandato conquistado nas urnas. Nesta semana, em conversa com o poste que Lula instalou no Planalto, o próprio Collor tratou de refrescar-lhe a memória: “Eu também fui eleito pelo povo”.


Em 1992, empenhado em abreviar o inquilinato do inimigo no gabinete presidencial, os chefões do PT argumentaram que escolhas equivocadas devem ser desfeitas quando colocam em risco o futuro do país. E enxergaram na queda do chefe de governo um triunfo do estado de direito. Neste inverno sem similares, os devotos da seita acusam de “golpista” quem constata que chegou a hora de encerrar um embuste que ameaça a sobrevivência do Brasil. Se Dilma sair, talvez ocorram algumas chuvas e trovoadas. Se ficar, a nação será castigada até 2018 pela tempestade perfeita.


Agenda de Renan é pouco para a economia reagir



Essa conjuntura, criticada por empresários e sindicalistas, só tende a provocar mais desemprego. Levantamento de hoje da Fiesp, a Federação das Indústrias de São Paulo, apontou o corte de 30 mil e 500 empregos em julho, o pior dado desde 2006. E a previsão é que os cortes cheguem a 200 mil até o final do ano. Só no Estado de São Paulo. 

A proposta de redução de jornada de trabalho, com corte de salários, deve segurar pouco o avanço do desemprego. Não há indicação de melhoria de atividade, nem a que costuma ocorrer com a proximidade do final do ano. Todas as datas do comércio têm sido piores que do ano passado. No dia dos pais, por exemplo, a queda foi de 5%. Sem consumo, difícil uma reação mais firme da indústria. As exportações até são beneficiadas pela alta do dólar. Só que temos uma economia fechada. O impacto das exportações é mais limitado. 

O consumo das famílias representa cerca de 60% do PIB enquanto o setor externo fica entre 20 e 25%. O fato é que a economia brasileira entrou em recessão no primeiro semestre e quase não conta com fatores de recuperação neste segundo. 

De acordo com a Serasa Experian, a atividade econômica caiu 1,4% no segundo trimestre, após a contração de 0,2% no primeiro. E a gente não vê o governo avançando com uma agenda positiva pra inverter o sinal. Tem agora a tal agenda Brasil do Renan, que não vai trazer estímulos mais consistentes. Fora o jogo de cena político, pra diminuir a pressão em cima do governo, tem muita proposta polêmica, de pouca eficácia, que vai contra até o que o governo defende. Pode ajudar um pouco em matérias tributárias; talvez, garantir maior receita. 

Mas não é isso que vai estabelecer um horizonte de crescimento. Estamos longe disso. Desemprego, queda do consumo, da confiança, baixa popularidade do governo, crise política, investigações da Lava Jato e risco da perda do grau de investimento são apenas algumas questões que comprometem o potencial de reação da economia.

Cuba é um objeto de museu



Amanhã, sexta-feira, o secretário de Estado americano, John Kerry, estará em Havana. Participará da reabertura da embaixada dos Estados Unidos. Ele vai hastear a bandeira do país dele, que só aparecia em Cuba para ser queimada, em protestos patrocinados pelo governo. Isso desde 1961, quando os dois países romperam relações diplomáticas. 

E vejam que curioso. Kerry é o primeiro chefe da diplomacia americana a pôr os pés em Havana em 70 anos. E mesmo sendo uma coisa bem excepcional, ele não vai ser recebido pelo ditador Raúl Castro. Para compensar, ele tem encontro marcado com líderes de grupos de dissidentes políticos. Mesmo assim, existem razões para comemorar essa reaproximação decidida no finalzinho do ano passado, e que é um episódio importante para a redemocratização da ilha do Caribe. Na minha opinião, Cuba é um objeto de museu. 

O socialismo por lá está envelhecido. Está coberto de poeira. A população já deu sua quota de sacrifícios, nesses 66 anos de regime comunista. E ela está sendo ainda sacrificada pelo embargo comercial dos Estados Unidos. Barack Obama anunciou no mês passado que pretende suspender o embargo. Mas não depende dele. Depende do Congresso, onde a oposição do Partido Republicano tem maioria na Câmara e no Senado. Esses deputados e senadores da direita sabem que o comércio com Cuba representaria muito pouco para os americanos. Mas ficam bloqueando as coisas pelo valor simbólico que elas têm. 

E no falar em Cuba, hoje Fidel Castro está completando 89 anos. O ex-ditador se afastou há quatro anos de seus cargos oficiais. Ele esteve muito doente. Já aposentado, Fidel virou blogueiro e escreve artigos para a imprensa oficial. Publicou um texto hoje. 

Em lugar de comentar a reabertura da embaixada americana, ele exigiu que os Estados Unidos paguem indenizações por causa do embargo comercial. Ele pode até ter razão. Mas vou dizer para vocês uma coisa: esse Fidel Castro me cansa. É assim que o mundo gira.